Alemanha cede, e o mais novo e poderoso blindado do Exército embarca para o Brasil

O Centauro II com as cores do Exército brasileiro, na sede da IDV, em Bolzano, na Itália, que foi enviado ao porto de Hamburgo, na Alemanha. (Foto: Divulgação/Exército Brasileiro

Centauro estava barrado pela autoridades alemães no porto de Hamburgo desde maio; blindado de fabricação italiana tem canhão de 120 mm e se junta a outras grande aquisições feitas pela Força

 

Marcelo Godoy* 
Embarcou nesta segunda (29) em Hamburgo, na Alemanha, e chegar no dia 15 de agosto ao Rio de Janeiro o primeiro blindado Centauro II-BR adquirido pelo Exército Brasileiro. Fabricado pelos italianos do Consórcio Iveco-OTO Melara (CIO), sua torre é equipada com um canhão de 120 mm. Trata-se de um Veículo Blindado de Combate de Cavalaria (VBC Cav), cuja compra faz parte do projeto de modernização das forças blindadas do País. Quando entrar em operação, O Centauro II-BR será o mais poderoso veículo do tipo na América do Sul.

A chegada da primeira unidade do blindado ao Brasil teve de superar a decisão do governo do primeiro-ministro alemão Olaf Scholz de reter o equipamento no porto de Hamburgo, conforme revelou Tecnologia & Defesa. As autoridades alemãs negaram se tratar de um embargo. A aduana daquele país justificou a medida alegando a falta de uma guia de transporte do Ministério Federal de Assuntos Econômicos e Ação Climática, o BMWK (sigla alemã para Bundesministerium für Wirtschaft und Klimaschutz).

O impasse começou no dia 28 de maio. Fazia quatro dias que a fábrica da Iveco, em Bolzano, no norte da Itália, havia enviado por terra o blindado até porto alemão de Hamburgo, onde a navio o aguardava para trazê-lo para o Brasil, a fim de passar por testes no Centro de Avaliações do Exército (CAEx), no Rio. Segundo a Iveco, os alemães verificaram que o despachante não havia solicitado a autorização de transporte do veículo pelo país. O pedido foi feito ao BMWK, em 31 de maio.

No dia 20 de junho, quando finalmente o blindado devia ser embarcado, a operação foi suspensa. No dia seguinte, a fabricante do Centauro II-BR enviou carta ao Exército brasileiro na qual informava a decisão dos alemães. Esperava-se que tudo se resolvesse em questão de dias, caso tudo dependesse apenas da obtenção da autorização de transporte. Havia a desconfiança de que fatores geopolíticos estivessem por trás da ação da autoridade portuária alemã.

O blindado Guarani fabricado pela Iveco em Minas; venda foi embargada pela Alemanha Foto: EXÉRCITO

Em 2023, a Alemanha havia embargado a venda de blindados Guarani do Brasil para a Filipinas. Fabricado pela Iveco em Minas Gerais, o Guarani tem componentes alemães, que precisam de autorização do governo de Berlim para serem vendidos. Pouco antes, o Brasil havia se recusado a fornecer à Ucrânia, uma aliada da Alemanha, armas e munições para enfrentar a invasão russa de seu território.

O conflito no Leste europeu e a ameaça representada pelo regime de Vladimir Putin fez a Alemanha aumentar seus gastos militares em cerca de € 100 bilhões, saltando de 1,3% para 2% de seu PIB. Embora as autoridades tenham negado desde o começo agir por razões geopolíticas, a desconfiança de que a alfândega de Hamburgo se movia em razão do descontentamento do governo Scholz com a política de neutralidade brasileira na Ucrânia aumentou com o tempo.

Havia ainda um outro fator que complicava o episódio. É que o fabricante, conforme o estipula o contrato, tinha até o fim deste ano para entregar as duas primeiras unidades do blindado para os últimos exames. O Brasil assinou em 22 de dezembro de 2022 o contrato de € 900 milhões, que previa a realização desses testes antes da conclusão da compra de outros 96 VBC CAV. Se, por qualquer motivo, esse prazo fosse descumprido, a Iveco seria desclassificada e o 2º colocado na licitação ocuparia seu lugar.

Para impedir que novas surpresas surjam no episódio, o Exército brasileiro a Iveco decidiram que a segunda unidade do blindado deixará o solo italiano diretamente para o Brasil, sem passar por nenhum outro país da União Europeia. Em vez de sair por um porto da França, como se chegou a cogitar, o segundo Centauro II-BR deve embarcar na Itália no dia 5 e atracar no Brasil no fim do mês.

A chegada dos dois Centauros resolve apenas um dos imbróglios vividos pelo Exército em relação às suas compras. Os militares aguardam a assinatura do contrato para a compra de 36 viaturas blindadas de combate, conhecidas como obuseiros de calibre 155 mm autopropulsados sobre rodas (VBCOAP-SR). A assinatura do contrato foi suspensa no dia 8 de maio, segundo o Exército, para uma nova análise jurídica do Ministério da Defesa.

Mas a verdade é que a escolha do vencedor da licitação que pode chegar a R$ 750 milhões, a empresa israelense Elbit Systems – e suas subsidiárias brasileiras Ares Aeroespacial e Defesa e AEL Sistema – despertou uma reação do Itamaraty e de lideranças petistas, que viram no contrato uma forma indireta de sustentar o esforço de guerra de Israel na Faixa de Gaza. O fabricante ofereceu o sistema Atmos 2000.

O Atmos israelense, um obuseiro de 155 mm autopropulsados sobre rodas, foi o escolhido pelo Exército em liictação Foto: Reprodução/Estadão

Também aqui suspeita-se que fatores geopolíticos tenham paralisado o processo. Do lado brasileiro, haveria pouca disposição de concluir o negócio enquanto Israel não concordar com o cessar-fogo votado pelo Conselho de Segurança da ONU. Do lado israelense, as necessidades da operação em Gaza e a de seus aliados envolvidos na operação na Ucrânia teriam alongado os prazos de entregas para países como o Brasil.

Foi o que aconteceu com outro equipamento que o Brasil: os mísseis Spike LR2 que o Exército brasileiro recebeu em julho. Uma centena deles chegou ao Rio de uma só vez em um carregamento embarcado em Israel após um atraso de um ano e meio – eles haviam sido comprados pelo Exército brasileiro em 2021 e deveriam ter sido entregues em outubro de 2022 pela Rafael Advanced Defense Systems Ltd. Os Spike LR2 vão equipar uma nova unidade do Exército: a 1.ª Companhia de Mísseis Anticarro Mecanizada (1.ª Cia Msl AC Mec), que fará parte da 11ª Brigada de Infantaria Mecanizada.

A Força Terrestre anunciou ainda a compra de 420 veículos blindados multiuso Guaicurus, um investimento de R$ 1,4 bilhão nos próximos dez anos. Atualmente, o Exército tem 32 desses blindados em serviço – parte deles foi enviada à 1.ª Brigada de Infantaria de Selva, em Boa Vista, Roraima, para enfrentar a ameaça representada pelo exército venezuelano diante da ameaça do regime de Nicolás Maduro de invadir a Guiana.

Guaicurus é fabricado pela Iveco e foi enviado pelo Exército à fronteira com a Venezuela Foto: Exército brasileiro

E, por fim, em um contrato de cerca de R$ 5 bilhões, o Exército acertou a compra de 12 helicópteros Black Hawk para a aviação da Força. O documento que autorizou a operação foi publicado no Diário Oficial no dia 19. Estava assinado pelo titular da Defesa, o ministro José Múcio e afirmava que a operação seria feita sem “compensação tecnológica, industrial e comercial”. Eles serviriam para manter a atual capacidade aeromóvel do Exército, que dispõe atualmente de quatro Black Hawk e oito helicópteros Cougars – todos chegando ao fim de sua vida útil. O pacote americano inclui ainda a venda de motores para reposição.

Trata-se ainda de um movimento insuficiente. O que cada um desses episódios mostra é que, sem uma base industrial própria, a defesa estará sempre sujeita aos humores estrangeiros. E não há País que possa dissuadir ameaças desses tempos novos apenas aproveitando oportunidades que a competição estratégica entre as potências pode oferecer à demais nações. Existe pouco consenso na Defesa. Mas um deles devia ser: ela não pode ser, primordialmente, um terreno de disputas partidárias e de interesses corporativos.

* Análise por Marcelo Godoy
Repórter especial do Estadão e escritor. É autor do livro A Casa da Vovó, prêmios Jabuti (2015) e Sérgio Buarque de Holanda, da Biblioteca Nacional (2015). É jornalista formado pela Casper Líbero.

ESTADÃO – Edição: Montedo.com

Respostas de 13

  1. Não sei qual é a motivação para comprar esses equipamentos fora do Brasil. existe empresas brasileiras que só precisam de apoio, com certeza conseguem entregar equipamentos de qualidade.
    Será que esses países vão fornecer reposição de equipamentos em caso de conflito com o Brasil?

    1. É claro que possuímos empresas capazes. Mas qualquer uma delas começaria um projeto desse tipo do zero. Agora pense um pouco, qual seria o custo do produto final?

      1. Mais caro ainda será a inobservância do Brasil
        em não investir por aqui na indústria bélica….o preço será salgado. Querem vender a fábrica de munições da Marinha, ferraram com a Engesa e agora tem a intenção de venda da avibras.

  2. O Brasil precisa inicialmente investimento em educação de qualidade e juntamente na indústria por exemplo Avibras, Embraer etc e tirar proveito disso tudo em vez de importar também exportar e não ficar refém de empresas internacionais simples assim…

  3. O Brasil presisa e de arma no clear melhor ter e não precisa do q precisar e não ter por q não adianta estados unidos ter xina ter Rússia Coreia ter frança ter e outros pais e o Brasil ser barrado pra não ter ficado de péndendo de americano ou outros pais Brasil tem q pensa no Brasil cada país pensa no seu povo eu só a favo de arma no clear brasileira sim melhor ter e não presisa usa do que presisa e não ter ese e meu ponto de vista

  4. Sim, concordo com o luiz nao podemos ficar dependendo do EUA e alguns paises da europa, temos china com tecnologia de ponta a russia com alta tecnologia em armamentos querendo armar o brasil, ja que pertecemos outro bloco que e do brics, temos que defender nossa soberania da amazonia tao cobicada

  5. Blindado é igual ao cavalo,nas guerras antigas, só serve para problemas internos;Em guerra hoje até um drone ACABA com ele,se é para ter se faz em casa, qualidade, material e emprego,além de mais barato.Se é para investir,comprei algo atual,ou conclui o projeto nuclear da marinha.

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