O apoio do comandante do Exército ao Supremo Tribunal Federal é um bem-vindo recado para os quartéisO comandante do Exército, general Tomás Miguel Ribeiro Paiva, deu uma inestimável contribuição à normalidade democrática ao manifestar-se favoravelmente à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que formou maioria contra o suposto papel de “poder moderador” das Forças Armadas em situações de crise institucional. Questionado em entrevista se estava de acordo com o voto dado até aqui por ministros da mais alta Corte do País, ele respondeu: “Totalmente. Não há novidade para nós. Quem interpreta a Constituição em última instância é o STF e isso já estava consolidado como o entendimento”.
Em breves palavras, o general cumpriu o que se espera de qualquer democrata, seja ele militar ou civil: defendeu a Constituição, reconheceu a instituição que tem a missão de interpretá-la e resguardou as Forças Armadas de qualquer outra interpretação fabricada pelo cinismo golpista dos últimos anos.
Assim como ministros do Supremo se viram perplexos ao precisar dedicar tempo e esforço para demonstrar algo elementar, não deixa de ser surpreendente que a declaração do general Tomás Paiva precise de reconhecimento e aplauso ao reafirmar obviedade igual. Mas convém lembrar a singularidade das circunstâncias: era necessário afastar de uma vez por todas o fantasma do “poder moderador” que extremistas tentaram emplacar, intoxicados por anos de fumaça bolsonarista.
A maioria do STF deixou evidente que nem o Supremo nem o presidente da República podem ser qualificados como “poderes moderadores”. Muito menos as Forças Armadas, nem sequer configuradas como Poder como o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Do mesmo modo, o chefe do Executivo tem prerrogativas limitadas, sem que a ele seja concedido o direito de recorrer às Forças Armadas para barrar a independência dos demais Poderes. A doutrina de que militares estariam constitucionalmente autorizados a intervir para arbitrar conflitos institucionais só existiu mesmo na cabeça de golpistas. Como sustentou o ministro Gilmar Mendes no seu voto, a hermenêutica da baioneta não cabe na Constituição.
O general Tomás Paiva sabe disso. Sabe também que as Forças Armadas estiveram engolfadas por esse fantasma, e que ainda há nelas uma pletora de infiltrados dispostos a ressuscitá-lo. Ele próprio – assim como outros legalistas do Exército, da Marinha e da Aeronáutica – foi vítima de ataques ferozes vindos dos quartéis e de militares instalados no Palácio do Planalto de Jair Bolsonaro. Num dos diálogos mencionados nas investigações sobre a suposta articulação do ex-presidente pela anulação das eleições, Tomás Paiva é duramente criticado por se opor à tentativa de golpe.
O oportuno recado do general emite sinais, portanto, para fora e para dentro dos quartéis, além de servir de importante premissa para o longo trabalho de despolitização das Forças Armadas. E demonstra que há situações nas quais a virtude da normalidade significa também uma excepcionalidade, como lenitivo a nos proteger de riscos institucionais. É este o caso.
4 respostas
Depois da porta arrombada, ficou para o difícil trabalho para o Comandante colocar tranca de ferro.
Nem li o resto … Estadão??? Kkkk folha De São Paulo? Veja ??? GLOBO lixo… sem credibilidade … igual as postagens do General Santos Cruz
O editorial esquece que estamos no século 21 e o cidadão não precisa e faz pouco caso de pronunciamentos de quem concorde ou discorde disso ou daquilo, principalmente o advindo de uma instituição sem legitimidade para opinar sobre decisões judiciais.
A personalidade citada fala exclusivamente em tom pessoal. As instituições funcionam com independência e harmonia de acordo com a lei, enquanto a lei for respeitada, do contrário instaura-se um clima de desconfiança, de insegurança, de censura, do policiamento da palavra, próprio de democracias mambembes, de estados disfuncionais, onde um poder subjuga outro à revelia da lei.
A disfuncionalidade institucional está presente no contexto do editorial do Estadão e é perceptível no cenário político nacional, prova disso é o inusitado questionamento do jornal sobre a opinião pessoal de um servidor subalterno em relação a decisão da mais alta corte do país. Ambas manifestações beiram o absurdo a ponto do inquirido se achar à vontade para, segundo o texto, estar totalmente de acordo.
Ora, em outros temas decididos pela suprema corte a imprensa buscará saber a aprovação das forças armadas ou, poderá o cidadão questionar os militares já que, embora não sejam poder moderador, são o poder fiador e, caso discordem das sentenças elas perdem a efetividade e executoriedade? Vê-se, portanto que estamos diante de uma crise de autoridade.
Hannah Arendt manifestou preocupação ao fenômeno porque conforme a filósofa, os governos totalitários surgem estruturados em resposta à crise de autoridade, não da autoridade personalíssima, não a limitada à perda de prestígio de um governante ou do sistemas de partidos, mas impregnado em áreas pré-políticas como a criação dos filhos e a educação, onde a autoridade no sentido mais amplo sempre foi compreendida com naturalidade.
Segundo Hannah, a origem da autoridade em um governo autoritário é sempre uma força externa e superior ao seu próprio poder; é sempre dessa fonte, dessa força externa que transcende a esfera política, que as autoridades derivam sua “autoridade” – isto é sua legitimidade – e em relação à qual seu poder pode ser confirmado. Logo, o que o editorial do Estadão materializa ao leitor é que a autoridade institucional do país não prescinde da aprovação dos militares, ela é subordinada a que eles estejam de acordo.
Para os bons entendedores fica a pergunta retórica de onde emana a autoridade dos poderes que atualmente dirigem país. Deveria emanar dos representantes eleitos pelo povo mas, enquanto silentes, cui bono?
a subserviência do Comandante do Exército ao supremo isso sim.