Guto Seabra
O amor à gemada (patente) estava no DNA. A dedicação, na veia. Era natural que um filho de militar posasse para fotos com farda e armas de brinquedo. Estudante do Colégio Militar de Brasília, não conseguiu avançar pela Academia Militar das Agulhas Negras (Aman). Foi reprovado. Inegável a frustração. Ingressou no curso de Direito da Faculdade Gama Filho. Faltando quatro períodos, largou. Por meio de um convite, assumiu função no Instituto Estadual de Meio Ambiente. Mais a frente, num cargo na Fundação Zoo-Rio, poria as garras de fora. Diante de registros de roubos de animais no Zoológico, não saía da 17ª DP (São Cristóvão). Uma arara-azul, diz ele, tem o custo de um fuzil.— Brincavam comigo, dizendo que era melhor deixar um formulário pronto com o meu nome. Até que convidei os delegados para conhecerem o zoológico — conta.
Na visita, os delegados se impressionaram com o catálogo feito por Sampaio para conferir a quantidade de animais. Era um obcecado por segurança. Na gíria, era um chato. Até que, ao sair do Rio Zoo, acabou contratado por uma dessas empresas. Foi um passo animal para entrar na Secretaria de Segurança. Em 2003, com Luiz Torres, um dos delegados da 17 DP à época, Sampaio Junior pôs seus pés na Seseg com cargo comissionado, feito por indicação. Mal tinha cadeira e os fios pendurados o incomodavam, além dos serviços burocráticos. Via nos manuais empoeirados de polícia o brilho do sonho. Passou noites em claro. Montou estratégias. Mas era um ”PI”, conhecido como pé-inchado pela ausência de estrelas, rótulo que o incomodava. Seus projetos, sustenta, pouco, ou nada, eram ouvidos.
— Todos se impressionavam com ele. Era muito hábil, rápido. Muitas vezes, devido à facilidade dele com o computador, rapidamente conseguia informações jurídicas na internet e sabia mais do que eu e outros policiais — diz Torres.
Em 2006, após ser responsável por montar uma base no Conjunto Nova Sepetiba I, sendo acusado de assédio sexual — não comprovado pela Corregedoria —, Sampaio deixou a cúpula da Segurança, mas não se desligou do sonho. Debruçou-se mais sobre biografias e livros que lhe renderiam conhecimento. Devorou mais de 50 calhamaços: Bin Laden, o Homem que declarou guerra à América; Comando Vermelho; cadernos de instrução do Ministério da Defesa; “Arte da guerra”, de Sun Tzu; registro de ocorrências da Polícia Civil do Rio… Paralelamente, tocava sua empresa de prestação de serviços na área de limpeza, conservação e, claro, oferecia segurança a empresas privadas.
— Consulados de outros países trabalhavam com o meu serviço de portaria.
Movido a adrenalina, a vida se tornava monótona. Com a empresa Caçadores de Aventura, mais tarde Via Guarani, Sampaio comandava cursos de rapel, sobrevivência… Participava também de equipes de paintball, sempre em pistas que simulavam a guerra urbana do Rio. Em fotos, a farda parecida com a da Polícia Militar do Rio aproximava da realidade:
— Era comprada da China, por site. Lá, tem uma equipe de paintball como esse uniforme.
Como diretor da Associação dos Alunos do Colégio Militar, Sampaio deu cursos.
— Não era pelo Colégio Militar. Era pela associação. Sem arma de verdade. Só você considerar espingarda de chumbinho, que qualquer um compra, em qualquer lugar…
Entre uma tarefa e outra, ele não saía de casa. Sua mãe, dona Terezinha, lhe apelidou de ”eletrodoméstico”. O computador era o ombro amigo, fonte de esperança. O tempo passava e ele armazenava dados. Montado em estatísticas, formulou estratégias de policiamento. Sempre com a tecnologia e a lábia. E, meio que por obra do destino, Sampaio regressaria à sua praia. Ele foi ao 6 Batalhão de Polícia Militar (BPM) resolver uma questão referente ao Boletim de Registro de Acidente de Trânsito (Brat), em 2009. Encontrou amigos que deixou na Seseg e, por fim, estava à mesa num almoço com oficiais e o coronel Fernando Príncipe, sedento por reduzir índices criminais na Grande Tijuca. De fato, em carne e osso, nascia o Major Sampaio. Sustentando que suas ideias esbarravam na falta de respaldo, ele inventou que havia conseguido judicialmente o direito de reaver sua patente. Imediatamente, ao “conseguir o direito”, saltou para tenente-coronel.
— Ué.. Basta dizer.. Basta dizer.. E as pessoas acreditaram… — explica ele o “processo” de efetivação imaginário.
2 respostas
O Coronel Caô como ficou conhecido no Rio é melhor do que muitos oficiais de "verdade" que estão na ativa…
País que só tem bandidos no poder (com rara exceção), não acho que ele fez nada de mais, mas ele poderia ser um bom politico, pelo é menos bandido.