Conforme o Radar OnLine da Veja já havia divulgado, seguido por este blog, a FAB escolheu o Grippen NG, sueco, ignorando a preferência de Lula e Jobim, pelo Rafale. Mais: o caça francês ficou atrás também do americano F-18 Super Hornet, alcançando a gloriosa posição de terceiro colocado entre três concorrentes.
Leia o artigo de Eliane Cantanhede, na Folha. Comento em seguida:
Contrariando Lula e Jobim, FAB opta por caças suecos
Aeronáutica recomenda compra do Gripen NG, o mais barato dos finalistas do FX-2
Relatório técnico contraria preferência pública pelos franceses manifestada pelo governo federal; decisão final cabe ao presidente
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
O caça francês Rafale, da empresa Dassault, ficou em terceiro e último lugar no relatório técnico que o Comando da Aeronáutica entregou ao ministro da Defesa, Nelson Jobim, sobre o projeto FX-2, de renovação da frota da FAB. O Gripen NG, da sueca Saab, ficou em primeiro lugar na avaliação, e o F-18 Super Hornet, da norte-americana Boeing, em segundo.
O resultado tende a gerar constrangimentos no governo e mais atrasos para a decisão final sobre o projeto de compra de 36 caças, ao contrapor a avaliação técnica da Aeronáutica pró-suecos à preferência política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da área diplomática pela oferta que foi apresentada pelos franceses.
A decisão pró-Rafale chegou a ser anunciada em nota conjunta assinada pelos presidentes Lula e Nicolas Sarkozy, em setembro passado, mas o governo brasileiro recuou depois da repercussão negativa na FAB e entre os concorrentes, já que a avaliação técnica nem sequer havia sido concluída.
Agora, o governo está num impasse: ou passa por cima do relatório da FAB e fica com os Rafale, ou desagrada o governo francês e opta pelo Gripen NG. Formalmente, o presidente Lula está liberado para escolher qualquer um dos três.
Conforme a Folha apurou, o “sumário executivo” do relatório da FAB, com as conclusões finais das mais de 30 mil páginas de dados, apontou o fator financeiro como decisivo para a classificação do caça sueco: o Gripen NG, até por ser monomotor e ainda em fase de projeto (se baseia no Gripen atual, uma versão inferior em performance), é o mais barato dos três concorrentes finais.
A diferença de valores é tanto no quesito preço do produto como no custo de manutenção. A Saab diz que ofereceu o Gripen pela metade do preço do Rafale, ou seja, algo na casa dos US$ 70 milhões. Afirma que a hora-voo de seu avião é quatro vezes menor do que a do francês, o que a Dassault rejeita: como o Rafale tem duas turbinas, é mais caro de operar, mas teria melhor performance.
Quem vai arcar com todos esses custos, durante os cerca de 30 anos de vida útil do jato, é a FAB, que considera a questão prioritária.
Pesou também o compromisso de transferência de tecnologia. O Gripen NG é um projeto em desenvolvimento que oferece em tese mais acesso a tecnologias para empresas futuramente parceiras, como a Embraer. Há a promessa genérica de produção final no Brasil, mas de resto o Rafale também diz isso. O problema é que o francês é um produto pronto, supostamente com menor taxa de transferência de conhecimento de produção.
O relatório da FAB não considerou como negativo o fato de o jato sueco ser monomotor, já que em aviões modernos isso é visto com um problema menor na incidência de acidentes.
Já o Rafale apresentou três obstáculos, na análise da FAB:
1) Continuou com valores considerados proibitivos, ao contrário do que o presidente da França, Nicolas Sarkozy, havia prometido a Lula.
2) O prometido repasse de tecnologia foi considerado muito aquém da ambição brasileira. Trata-se de um “produto pronto”, que teria, ou terá, dificuldades para ser vendido a outros países a partir do Brasil.
3) A Embraer, consultada pela Aeronáutica, declarou que, se fosse o Rafale, não teria interesse em participar do projeto, pois lucraria muito pouco em tecnologia e em negócios.
O relatório foi feito pela Copac (Comissão Coordenadora do Programa Aeronaves de Combate) e ratificado pelo Alto Comando da Aeronáutica no dia 18 de dezembro.
Jobim voltou ontem à noite a Brasília pronto para se reunir com o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito. Oficialmente, para ganhar tempo, a versão do governo é que a FAB ainda não lhe entregou o documento.
O ministro já sabe do resultado desde uma viagem que fez com Saito à China e à Ucrânia, no final do ano. Os dois aproveitaram uma escala justamente em Paris para discutir a questão com o presidente da Copac, brigadeiro Dirceu Tondolo Noro, que, conforme a Folha apurou, foi chamado de última hora a viajar à capital francesa para encontrá-los.
É uma das grandes compras em curso no mundo, e pode bater os R$ 10 bilhões.
Em entrevista à Folha em dezembro, Jobim admitiu que tinha interferido para mudar as regras do relatório da Copac, mas sem assumir que a intenção era evitar que a FAB indicasse um favorito que não batesse com o do Planalto.
Comento:
O relatório da FAB sobre os caças, estranhamente, veio à tona no mesmo momento em que estourou o embate entre os fardados e a esquerda revanchista. Notem que Jobim é aliado dos generais no episódio da tal Comissão da Verdade, entretanto, fecha com o presidente quanto a compra dos caças franceses, anunciada em clima de euforia por Sarkozy e Lula em setembro, durante as comemorações da Independência do Brasil.
Evidentemente, uma questão terá interferência na decisão sobre a outra. O governo protelará o quanto puder a divulgação do relatório, na tentativa de forçar a FAB a mudá-lo. Afinal, se contrariar um levantamento técnico criterioso como o feito pelos militares,num negócio de muitos bilhões de dólares, Nosso Guia abre o flanco não só para, aí sim, uma crise militar, como para as críticas da oposição e eventuais questionamentos judiciais que, mesmo não chegando a lugar algum, podem gerar um grande desgaste em ano eleitoral.
Já na questão da revogação da Lei de Anistia é mais fácil enrolar os milicos. Lula sabe muito bem que Vannuchi, Dilma, Tarso et caterva não abrirão mão de sua vendetta. Assim, pode jogar a decisão para a frente ou mudar o texto do decreto de forma a acalmar os generais. O tema certamente voltará à baila mais adiante.
Difícil prever os desdobramentos do imbróglio, mas, percam os militares ou os revanchistas, os suecos, franceses ou americanos, certamente Lula, por sua esperteza política insuperável, embalado pela popularidade recorde, sairá ganhando seja qual for o resultado…