Presidente do STM se diz preocupada com o aumento de abusos sexuais nas Forças Armadas

A ministra Maria Elizabeth Rocha, primeira mulher eleita para presidir o Superior Tribunal Militar — Foto: Divulgação/STM

Ministra Maria Elizabeth palestrou em evento da Ouvidoria da Justiça Militar de MG

Belo Horizonte – Desde que em janeiro deste ano o Exército Brasileiro abriu alistamento voluntário para as jovens de 18 anos, a chegada desse contingente às fileiras da instituição tem sido motivo de preocupação. Isto porque tem se observado um aumento de casos de assédio sexual nas Forças Armadas em geral.

O problema foi tratado pela ministra Maria Elizabeth Rocha, do Supremo Tribunal Militar (STM), em palestra na Ouvidoria da Justiça Militar, realizada em Belo Horizonte em 29 de abril, onde foi convidada a falar sobre “O combate à violência de gênero: As instâncias Correicionais do Superior Tribunal Militar na Relativização das Interseccionalidades Contemporâneas”.

Elizabeth Rocha exibiu números, de fato, inquietantes, e justificou a sua apreensão lembrando “o inegável aumento das mulheres nas Forças Armadas brasileiras, fenômeno potencializado com o advento do alistamento para o serviço militar feminino, em janeiro, quando 23 mil mulheres se inscreveram no processo seletivo em um único mês”.

[…]

Na exposição da ministra, ela citou o exemplo, fornecido durante a 11ª Conferência Internacional sobre Capacitação do Poder Judiciário, em Seul, na Coréia do Sul, pela juíza auditora Natascha Maldonado. Segundo a juíza, dentre os crimes de natureza sexual mais recorrentes na Justiça Militar da União, entre janeiro de 2021 e agosto de 2024, 3% foram de violação de recato; 14% eram de estupro; 34% diziam respeito a assédio sexual; e 49% retratavam importunação sexual.

A magistrada também mencionou pesquisa realizada nas Forças Armadas, ainda em 2021, na qual se constatou que, a despeito do número ainda reduzido de mulheres na caserna, em 78% dos casos as vítimas eram do gênero feminino. E para reforçar as informações trazidas a público, forneceu um dado: “apenas 6% do contingente do Exército é formado por mulheres. Na Marinha, as mulheres representam 12%; e, na Força Aérea, 21%. Isso demonstra a reprodução, no âmbito militar, da cultura social de violência de gênero em que se constatou que, no ano passado, 88% dos crimes de estupro no Brasil foram praticados contra mulheres”.

“Parece-me que conjugar a condição de mulher e de militar talvez não se amolde ao conceito de interseccionalidade tradicionalmente estabelecido em 1989 (o de seccionalidade)”, destacou a ministra Maria Elizabeth, em sua palestra.

A pesquisa “Assédio Sexual nas Instituições de Segurança Pública e nas Forças Armadas” e mencionada por ela, foi desenvolvido pela juíza auditora Mariana Aquino em parceria com o juiz de Direito Rodrigo Foureaux. O estudo continha 18 perguntas dirigidas ao contingente feminino e recebeu respostas de 1.897 mulheres das carreiras militar, policial, de bombeiro e da guarda municipal das mais variadas regiões brasileiras. Como resultado, 74% delas relataram haver sido vítimas de assédio sexual e, em 83% desses episódios, as entrevistadas não denunciaram o abuso sofrido.

“Os autores concluíram que o assédio se manifesta de modo contumaz nas Forças Armadas e nos órgãos de Segurança Pública, advertindo que essas instituições não promovem campanhas de prevenção vocacionadas a coibir a perpetuidade de tais práticas sob a perspectiva de gênero”, observou a ministra, comentando o Capítulo desse estudo que lhe chamou especial atenção: “foi o depoimento de policial penal mulher a respeito da tradição sexista compartilhada pelos seus colegas de farda homens nos presídios. Ela citou ‘Brincadeiras indecentes, insinuosas, machistas, desrespeitosas, abraços maliciosos e olhares inconvenientes que, por vezes, sofre no dia a dia. Para não sofrer retaliações a policial disse levar na esportiva’”.

Em relação às Forças Armadas, 71,2% das entrevistadas na pesquisa trazida pela ministra informaram ter sofrido assédio sexual. Sob o prisma da violência de gênero na caserna e nas instituições de segurança pública, foi identificado que os assediadores eram cometidos por superiores hierárquicos em 85,5% dos episódios. Igualmente, revelou que, em 10,2% dos casos, o assédio sexual foi praticado por profissional de igual patente e que, em 2% deles, o ilícito foi cometido por agente subordinado à vítima.

Paralelamente, no ensaio empírico Assédio Sexual na Polícia Militar do Pará: um Reflexo Negativo das Relações de Trabalho e Gênero, os acadêmicos Fábio Ricardo e Eunápio Dutra constataram que 44% das 90 militares inquiridas se reconheceram vítimas de assédio sexual. Ainda, 73% delas informaram haver testemunhado alguma forma de assédio no trabalho.

No Rio, por sua vez, o estudo A Violência Silenciosa: Percepções Femininas sobre o Assédio na Polícia Militar do Rio de Janeiro, a jurista Cláudia Rosa identificou que, das 217 militares consultadas, 75% reportaram ter sofrido assédio sexual ou moral e que 47,2% delas foram vítimas de assédio sexual.

Ao fim, acrescento análise desenvolvida pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em parceria com a Fundação Getúlio Vargas, denominada As Mulheres nas Instituições Policiais, revelou que 39,2% das policiais interpeladas foram vítimas de assédio moral ou sexual e que 25,5% delas sofreram assédio sexual.

“Esclareço que o conceito de assédio sexual empregado na pesquisa foi o de contato físico entre agressor e vítima, cenário extremamente restrito e que justificaria, em tese, o modesto percentual detectado quando comparado às análises previamente mencionadas. De todo modo, se considerado o critério metodológico adotado, o índice me parece nitidamente significativo”, completou a ministra, Maria Elizabeth.

Numa ação mais efetiva para o combate a esses crimes, e atento aos desvios dessa natureza nas Forças Armadas, o Superior Tribunal Militar, manteve condenação, por unanimidade, imposta pelo juízo de primeiro grau a militar que praticara crime de assédio sexual em desfavor de sua subordinada.

“A Justiça Militar da União, na missão constitucional de proteger a ‘ultima ratio’ do Estado, deve reprimir os delitos praticados contra a dignidade sexual, especialmente quando atingirem os subordinados do agente”, esclarece a ministra.

“Os crimes dessa estirpe, por sua gravidade, exigem proporcional resposta Estatal. Nesse cenário, sem qualquer condescendência, a Justiça Especializada reprime os delitos de natureza sexual e, fruto do ataque ao bem jurídico tutelado, protege as mulheres”, reforça.

Segundo a ministra, “inúmeros mecanismos foram implementados pelo Superior Tribunal Militar no sentido de outorgar visibilidade ao tema, a exemplo da adesão à campanha 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher, concebida pela Organização das Nações Unidas e fomentada pelo Conselho Nacional de Justiça.
msn – Edição: Montedo.com

Respostas de 18

  1. Esse tipo de crime acontece porque não há punição.

    Bater no subordinado nu, como acontece em cursos supostamente operacionais, não acrescenta em nada na formação, a não ser traumas em quem apanha e vazão de alguma fantasia perversiva de quem bate.

  2. A Ministra deveria se preocupar com os Subtenentes, Sargentos, Cabos, Taifeiros e Soldados, por estarem ganhando uma merreca.
    Deveria se preocupar Também com a Miséria de 4,5% de reajuste dado aos militares depois de 06 anos sem reajuste nos soldo.

  3. Isso somente acontece por causa que ” ganhamos pouco”, isso torna alguns oficiais violentos (SQN). A realidade é que fatos criminosos acontecem em Praticamente em todas as GRANDES empresas, instituições, e não seria diferente nas Forças Armadas e de Segurança Pública, algumas “perturbações ou assédios” poderiam ser resolvidas com uma boa conversa sobre ética, principalmente quando se tem uma equipe de profissionais trabalhando, fatos assim raramente acontecem.

    1. Concordo em parte.

      O trabalho de prevenção deve ser feito por meio de palestras, etc.

      Mas o assédio deve ser resolvido com pUNIÇÃO, porque o trauma já ficou na vítima. Não é uma coisa simples a ponto de só conversar.

  4. Ninguém se preocupa com o salário irrisório pagos aos milicos, com a grande evasão de militares em busca de melhores condições de trabalho e remuneração.
    Hoje vivemos no modismo da era da Lacração.

    1. Abuso sexual não é lacração.

      Vai no google que você talvez entenda.

      Eu disse “talvez” porque uma mente binária como a sua, que trata a justa causa do reajuste como excludente da causa justa do combate ao assédio pode ter dificuldades de entender, dado o nível crítico de cognição.

  5. 11ª Conferência Internacional sobre Capacitação do Poder Judiciário, em Seul, na Coréia do Sul

    Ô coisa boa sô.

    Detalhe: a coreia do sul, que está em guerra ha 80 anos (apenas um armistício), não tem uma justiça militar como a nossa em tempo de paz.

  6. Nesses dois no cargo de Presidente do Tribunal vai dar uma entrevista por semana, no mínimo. E o assunto não interessa.

    O que interessa é se colocar como “poliicamente correta” para encantar alguém que possa levar seu nome para o Inquilo do Alvorada alçá-la ao STF.

    “O resto não interessa”…

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