Disciplina não é opcional para os militares
Diretriz do Exército para conter politização é bem-vinda. Mas nenhum militar indisciplinado o é por falta de vedação normativa. Punição dos transgressores é que mantém a tropa na linha
O Exército publicou em seu Boletim do dia 1.º de novembro uma diretriz cujo objetivo é “fortalecer nos integrantes do Exército, em todos os escalões, o entendimento e a aplicação da ética profissional e da liderança militar”. Na prática, o chefe do Estado-Maior, general Richard Nunes, espera que as novas instruções contenham a evidente politização de parte da tropa, mantendo-a coesa em torno dos “objetivos institucionais” da Força Terrestre.
Vê-se que, de fato, há um sério problema no seio do Exército quando um compromisso comezinho dos militares como esse – atuar com ética e respeitar a hierarquia – precisa ser reforçado por escrito pelo Estado-Maior, com o óbvio respaldo do comandante Tomás Paiva, entre os soldados. O chamado “pundonor militar” sempre foi ponto de honra para os membros do Exército, da ativa ou da reserva. Embora registradas em leis, normas e regulamentos, honra e ética nunca precisaram ser impostas ou lembradas – até a contaminação das Forças Armadas pelo golpismo de Jair Bolsonaro.
Dito isso, é louvável que, na prática, o documento publicado pelo general Richard sirva para relembrar aos seus companheiros de Exército, “fardados ou não”, como ele fez questão de enfatizar, que a disciplina e o respeito à hierarquia não são opcionais para os homens e mulheres de farda. Preocupado, com razão, com a desordem informacional que grassa no ambiente digital, ao qual os militares, como quaisquer cidadãos, têm acesso, o chefe do Estado-Maior ressaltou a importância de “desenvolver o pensamento crítico do militar, com base nos preceitos da ética profissional, para adequar-se ao ambiente virtual”.
A despeito da pertinência do alerta e da correção do objetivo, é forçoso dizer que o papel aceita tudo. Convém recordar que não foi por falta de leis, normas ou códigos de ética que militares indisciplinados, no melhor cenário, e sediciosos, no pior, afrontaram os valores das Forças Armadas e, no limite, o Estado Democrático de Direito. Regras, evidentemente, são fundamentais, mas viram letra morta quando aqueles que as violam, em alguns casos flagrantemente, não são punidos como deveriam.
Recorde-se, à guisa de exemplo, a leniência com que o Exército tratou a indisciplina do então general da ativa Eduardo Pazuello, hoje deputado federal. Em maio de 2021, o intendente Pazuello subiu e discursou em um palanque ao lado de Bolsonaro, no Rio, durante um ato que se prestou a uma espécie de desagravo após seu depoimento à CPI da Covid, no Senado. A óbvia violação do Regulamento Disciplinar do Exército e do Estatuto das Forças Armadas, que vedam taxativamente a presença de militares da ativa em atos de cunho político-partidário, ficou impune. O comandante do Exército na ocasião, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, arquivou o processo disciplinar aberto contra Pazuello por entender que “não restou caracterizada a prática de transgressão disciplinar”.
O caso Pazuello é paradigmático porque exemplifica, de forma gritante, o problema que se impõe à instituição – e que não será apenas uma nova diretriz que vai resolver. A leniência com a qual a indisciplina do hoje deputado foi tratada enviou uma mensagem perigosa de que o desrespeito à hierarquia e à ética pode passar impune quando certos interesses políticos estão em jogo. O compromisso com a ética e a disciplina que se espera das Forças Armadas não deve ser mera promessa, tampouco formalidade, mas sim uma prática assegurada por punições efetivas e rigorosas contra qualquer transgressor, independentemente de seu posto ou de suas relações políticas.
A politização faz mal para as Forças Armadas. Toda iniciativa para evitá-la é bem-vinda e será apoiada por este jornal. Porém, mais do que normas e regulamentos, que ademais já existem, só a punição efetiva dos transgressores terá o condão de manter as Forças Armadas, o Exército em particular, no trilho da normalidade institucional e, principalmente, dentro dos estritos limites de atuação que a Constituição fixou para os militares no regime democrático.
ESTADÃO – Montedo.com
9 respostas
Essa indisciplina não é de hoje. A tropa perdeu o rumo depois do golpe articulado em 15 de novembro de 1889.
Sabe o que significa expulsar o Imperador Pedro II do próprio país?
Deodoro, Floriano, Custódio de Melo, Saldanha da Gama, Miguel Costa, Carlos Prestes, Haroldo Veloso, Mourão Filho, Bozo, Pazuello, Cid… e por aí vai. Todos se achavam ( alguns ainda acham) acima da Constituição em seus diferentes tempos históricos.
Simplesmente perfeito.
Concordo com tudo citado aqui, (Disciplina/Reajuste – uma coisa não justifica a outra), porém, o Reajuste salarial dos Militares para manter os proventos atualizados de forma justas anualmente, sem perdas, “TAMBÉM NÃO É OPCIONAL” do Governo Federal!
Caro colega; entendo o drama referente aos atuais salários. Já passei por isso. Fiz uma opção, pois já sabia que dificilmente as coisas iriam melhorar. Continuei estudando, prestei novo concurso público e me afastei da Força. Graduados nunca foram valorizados nas 3 forças. Isso é histórico. Triste realidade.
Idem. Fiz o mesmo. Era oficial superior.
12 anos de Caserna, e parece que nada mudou. Me formei, estudei, e passei em outro concurso público.
Não adianta só reclamar !!!!
Excelente. Mais como deixei passa muito tempo (18 anos), perderia se Saísse naquele momento. Dediquei-me o máximo na formação de meus filhos, esposa e Comecei a aprimorar meus conhecimento, Haja vista ser formado em licenciatura. Fiquei exatamente 30 anos, 4 meses e 2 dias, nada além. Na reserva leciono como temporário em regime de 20 horas, três vezes na semana, de 09h às 12h. Dois dias são para coordenação externa. Poderia até ficar em casa, mas gosto de lecionar, e uma graninha a mas não mal a ninguém. Melhor do que aqueles 30% Ilusórios. Hoje 53 anos, filhos formados e esposa, só alegria.
Vamos de Potiguar?
Somente um aparte: avisa isso aos Bozoides de plantão, pois todos pregam implodir os pilares do militarismo, sob ordem de seu “líder supremo”, o qual deveria receber o título de indisciplinado-mor.
A Tropa segue o exemplo de Seus superiores, se eles dão bom exemplo, a Tropa lhes segue, se o exemplo é ter o discurso, os atos e as mentiras, Arrogância, subserviência, ambição pelo poder e também desenfreada pelo dinheiro, em alguma ou, de alguma maneira, a Tropa se espelha. Se o militar é militar em deveres até a sua morte, também o é em direitos, entretanto, Em época de viagens a Marte e computadores do tamanho de uma caixa de fósforos, em paradoxo, as FFAA vivem com o pensamento na época de lampião a óleo de baleia. Tenho a impressão que algum Chefe poderia me mandar para fogueira se eu dissesse aqui que a terra é redonda e gira em torno do sol, se pudesse, com certeza mandaria, se pudesse.