“Amada e Ultrajada”
Erich Thomas Mafra
Qual é a verdadeira função do Exército Brasileiro? É um agente político? Um órgão regulador? Um ente para organizar a defesa do país? Um caminho para salvar a democracia? De acordo com o artigo 142 da Constituição Federal, as Forças Armadas “destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”. Todos esses matizes da instituição são representados pela Brasil Paralelo em sua nova série documental, Amada e Ultrajada: O Exército na História do Brasil.
A produção, que teve seu terceiro e último episódio divulgado em 23 de outubro, investiga como diferentes figuras históricas utilizaram do órgão em decisões de impacto, como Dom Pedro I no Dia do Fico, Getúlio Vargas na Revolução de 30 e o General Olímpio Mourão Filho na deposição de João Goulart, em 1964. Para oferecer esse retrato de maneira completa, a BP apresenta em conjunto a história do nosso país, desde a chegada dos portugueses.
No primeiro capítulo, intitulado Precursor da Liberdade, o tom é dado de forma bastante objetiva. Com material histórico e depoimentos de especialistas, como o cientista político Luiz Philippe de Orléans e Bragança, o historiador Rafael Nogueira e o economista Gastão Reis, são apontados os prós e contras de todas as ações que envolveram o Exército.
Há relatos interessantíssimos sobre a Batalha dos Guararapes, uma disputa iniciada em 1648 que colocou os primeiros portugueses nascidos no Brasil contra os holandeses. Também é explicado como as forças de Portugal se organizaram para a formação do Exército Imperial Brasileiro.
Já a segunda parte, chamada O Destino pela Espada, esmiúça como a entidade criada para a defesa do Império e seu regente (D. Pedro I) acabou se transformando no catalisador da queda desse próprio governo. Nada disso será grande novidade para quem é apaixonado por história e estudou o tema com afinco. Porém, recordar essas passagens ajuda o cidadão brasileiro a entender como o exército tem, de fato, grande influência nos caminhos que a democracia seguiu desde sua fundação.
Os finalmentes
Ao encerrar o segundo episódio justamente na queda da Monarquia, a Brasil Paralelo gerou tremenda expectativa para a última parte de Amada e Ultrajada: O Exército na História do Brasil. Afinal, ela cobriria dois dos momentos mais emblemáticos do Exército na memória recente dos brasileiros: o “golpe de 1964 e os eventos de 2023”, como a própria empresa identifica na sinopse do capítulo O Partido Verde Oliva.
Após dois meses da estreia da série, o conteúdo chegou à plataforma e trouxe mais duas horas de material, funcionando quase como um documentário independente do resto. Ex-presidentes como Marechal Deodoro da Fonseca e Getúlio Vargas ocupam boa parte do relato, deixando tudo a partir da queda de João Goulart para os quarenta minutos finais.
Isso poderia ser um balde de água fria para quem esperava que a série se debruçasse com maior dedicação em1964 e 2023. Mas Amada e Ultrajada exibe uma visão ponderada a respeito de todos os acontecimentos. Há críticas sobre o artigo 142, por exemplo. Também é mencionado como alguns generais deram esperanças à população até o último segundo em janeiro de 2023. “Ao longo da história republicana, a sociedade civil brasileira não teve uma reação à altura para botar os militares em seu devido lugar”, afirma Gastão Reis, próximo da conclusão do documentário.
“É muito curioso que, hoje, o STF (Supremo Tribunal Federal) descubra que os militares não podem ser poder moderador. Não podiam desde 1889! Mas a sociedade brasileira tolerou isso por décadas e décadas. Aí qualquer coisa você já recorre aos militares. Isso é falência institucional”, crava o economista.
Com comentários nessa linha, a Brasil Paralelo propõe uma reflexão aos espectadores. As três partes de Amada e Ultrajada ofertam material de sobra para quem está disposto a pensar sobre como o Exército se encaixa em nossa democracia e o que poderia ser alterado na relação entre o ente e o Estado.
Amada e Ultrajada: O Exército na História do Brasil (2024)
– Três episódios
– Indicado para maiores de 16 anos
– Disponível na Brasil Paralelo
GAZETA DO POVO – Edição: Montedo.com
4 respostas
“garantia dos Poderes…da lei e da ordem” penso que poderia ser melhor discutido nesse art. 142.
Não é papel das FA garantir a lei e a ordem. FA é para guerra, proteger o país de agressões externas.
E sem falar nas atividades de defesa civil, como resgate em enchentes, matar mosquito, combater incêndio, ser “reformatório” para menor infrator (como quer um deputado), etc, etc.
Para essas atividades que criem uma Guarda Nacional, a exemplo do que ocorre em outros países.
Não quero ser um estraga prazeres, mas esse documentário tem como “especialistas” pessoas de forte viés político e nada republicano, pelo contrário, eles são curiosamente monarquistas. Sim, são monarquistas, defendem essa causa e detestam a república.
Nada contra quem tem essa simpatia (pela monarquia), mas é importante saber que a abordagem desse documentário, quando falam do exército na democracia, tem uma forte inclinação política dos produtores.
Se mesclassem opiniões divergentes, seria mais rico para quem assiste. Porém, um documentário histórico com forte viés político, não só deforma a história como emburrece.
Vai lá e faça um documentário em contraponto. Quem sabe tenha sucesso apresentando a tua história dos fatos.
Golpe Em 1889, Golpe Em 1891, Golpe Em 1937, Golpe Em 1964, autogolpe em 1968, tentativa de golpe Em 2023… tá aí o resumo