PEC 42/23 que proíbe candidatura de militares da ativa amputa direito

PEC

É inconstitucional tirar os direitos políticos das Forças Armadas e das polícias estaduais
Ives Gandra da Silva Martins*
A PEC 42/23, apoiada pelo governo Lula, visa reduzir a politização nas Forças Armadas, garantindo igualdade de cidadania para os militares. Contudo, o senador Mourão questiona sua proposta de limitar direitos políticos, alegando violação de cláusula pétrea.

A proposta de emenda (PEC 42/23), patrocinada pelo governo Lula, tramita no momento no Senado. Ela foi pensada como uma medida para tentar reduzir a politização das Forças Armadas. “Os militares não são cidadãos de segunda categoria por terem escolhido a carreira das armas”, afirma Ives Gandra Martins em seu parecer ao Senador Mourão.

Consulta-me o senador Hamilton Mourão sobre a PEC 42/23, que pretende eliminar o direito de pleno exercício da cidadania e de direitos políticos de militares das Forças Armadas e das polícias estaduais, alterando cláusula pétrea da Lei Suprema (artigo 60, §4º, inciso IV).

Nesta esteira, segundo o texto inicial da referida PEC, o artigo 14 passaria a dispor nos seguintes termos:

“Art. 14.  (.)

§ 8º Os militares alistáveis dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios são elegíveis, atendidas as seguintes condições:

(.)

§ 8º-A O militar alistável das Forças Armadas é elegível e, no ato do registro da candidatura, fica transferido para a:

I – reserva não remunerada, se não preencher as condições de transferência a pedido para a inatividade remunerada; ou II – reserva remunerada, se preencher as condições de transferência a pedido para a inatividade remunerada.

(.)”

Resposta

Em breve opinião legal, respondo ao ilustre parlamentar minha opinião a respeito.

Todo o Título II da Constituição (artigos 5º a 17) é considerado o mais relevante da Lei Suprema.

É que uma Constituição é destinada ao povo, cabendo aos governantes servirem-no, pois para isto, numa democracia, foram pelo povo escolhidos.

Ora, o referido título é dedicado aos direitos e garantias fundamentais, sendo o disposto no artigo 5º, que enumera grande parte dos direitos individuais, e os artigos 12 a 17 dedicados à nacionalidade e à cidadania (direitos políticos), os que completam o elenco e dimensão do ser social que é o homem, ou seja, como indivíduo e como integrante do meio em que vive e exerce sua cidadania.

Tenho para mim, nada obstante posições doutrinárias contrárias, que também os direitos sociais complementam as garantias fundamentais da pessoa humana (cidadão ou residente), sendo expressão sobrevivencial da espécie, colocando-os, portanto, entre os direitos individuais, aqueles do artigo 6 a 11.

Não sem razão, deu o constituinte ao Título II a denominação de “Dos Direitos e garantias fundamentais”.

Assim sendo, entendo que – e foi esta a posição de Celso Bastos e minha, nos comentários que fizemos pela Saraiva de 1988 a 1998, em 15 volumes e em torno de 10 mil páginas, da Carta da República -, o indivíduo, sua nacionalidade, cidadania e dimensão laboral conformam a integridade de sua personalidade, que ficaria amputada se qualquer destas dimensões lhe fosse tirada.

Nos 20 meses da Constituinte, muitas vezes consultados por constituintes, pelo presidente Ulysses Guimarães e relator Bernardo Cabral, sobre participarmos de audiências publicas, foi o que sentimos dos dois naqueles trabalhos em que parlamentares e especialistas atuaram intensamente.

Na ocasião, decidiram os elaboradores do texto máximo que as duas cláusulas pétreas da Constituição anterior (República e Federação) deveriam ser alargadas, consideravelmente; daí surgindo o artigo 60, §4º da Carta Magna com a seguinte dicção:

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

a forma federativa de Estado;
o voto direto, secreto, universal e periódico;
a separação dos Poderes;
os direitos e garantias individuais.

Entendo até mesmo que o §4º, ao falar em direitos e garantias individuais, isto é, pertencentes a todos os cidadãos, residentes e pessoas no território nacional, que teriam proteção sob determinados aspectos legais, que a imodificabilidade constitucional estender-se-ia além do Título II, sempre que direitos fundamentais de dimensão individual fossem atingidos, como, por exemplo, no tópico do artigo 150, em que se percebe esta extensão, sendo o seguinte o seu discurso:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (.).

O certo, todavia, é que os direitos e garantias fundamentais podem ser acrescidos, mas não há possibilidade constitucional de reduzi-los sem que seja ferido drasticamente o direito do indivíduo em uma democracia. É, para mim, cláusula pétrea todos os direitos individuais garantidos pela Lei Suprema, estando entre eles, enquanto houver democracia no país, o direito de poder exercer a cidadania em sua plenitude nos termos da Lei Suprema aprovada em 5/10/88.

Ora, o § 8º do artigo 14 da Constituição versado está como se segue:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

(.)

§ 8º O militar alistável é elegível, atendidas as seguintes condições:

se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-se da atividade;
se contar mais de dez anos de serviço, será agregado pela autoridade superior e, se eleito, passará automaticamente, no ato da diplomação, para a inatividade.

É que a cidadania é a dimensão maior do ser gregário, que é o ser humano, pois de poder viver e decidir no ambiente que vive.

Ora, se a simples inscrição para concorrer nas eleições fará o militar perder todos os direitos de sua carreira, inclusive o de remuneração na reserva ou não, se houver pedido para a inatividade, há uma imensa diminuição de direitos da cidadania incompatível com um Estado Democrático de Direito.

PEC é inconstitucional, pois retira direito de cidadãos
Tornar o militar, enquanto na ativa – que exerce função tão relevante, a ponto de o constituinte de 88 ter denominado o Título V dedicado às Forças Armadas, policiais militares e guardas municipais de “Da Defesa Do Estado e das Instituições Democráticas” -, um cidadão amputado na sua ampla cidadania é macular drasticamente o direito maior que os cidadãos tem numa real democracia, razão pela qual entendo que a PEC 42/23 é de manifesta inconstitucionalidade.

O §8º não pode ser modificado, pois garante direito que não pode ser decepado do exercício da cidadania.

Os militares não são cidadãos de segunda categoria por terem escolhido a carreira das armas. Não podem ser desconsiderados pela sociedade como párias inúteis no exercício da cidadania, sem direito de concorrer a cargos públicos para servir o país de outra forma, a não ser com perda de direitos adquiridos em sua carreira militar.

Certa vez, o ministro Francisco Rezek, em audiência na Suprema Corte, ao detector uma manifesta inconstitucionalidade, utilizou-se da seguinte imagem, dizendo que a fumaça do bom direito era tão forte contra a lei impugnada que ele mal conseguia ver os ministros que se encontravam na bancada oposta no plenário físico da instituição.

É como vejo esta PEC que pretende reduzir a nobreza de uma função que os constituintes, no Título V, consideraram relevante para a defesa da pátria e das instituições, tornando os militares cidadãos inexpressivos, de segunda categoria, com restrições ao sagrado direito, num regime democrático, de concorrer às eleições.

* Ives Gandra da Silva Martins
Presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio/SP. Professor emérito da Universidade Mackenzie e das Escolas do Comando e Estado Maior do Exército (ECEME) e Superior de Guerra (ESG). Advogado e fundador da Advocacia Gandra Martins.

 

10 respostas

  1. Os Militares Da Ativa Devem Devotamento Total As Atividades Militares, Ser Político Ou Ocupar Cargo Civil, Mesmo Temporariamente, Não Fazem Parte Da Atividade Militar, Portanto Deveriam Ser Licenciados Ex-Officio, Para Exercerem Nova Provisão Ou Atividade, tanto oficiais como os praças.

    LEI Nº 6.880, DE 9 DE DEZEMBRO DE 1980

    Art. 5º A Carreira Militar É Caracterizada Por Atividade Continuada E Inteiramente Devotada Às Finalidades Precípuas Das Forças Armadas, Denominada Atividade Militar.

    § 1º A Carreira Militar É Privativa Do Pessoal Da Ativa, Inicia-Se Com O Ingresso Nas Forças Armadas E Obedece Às Diversas Seqüências De Graus Hierárquicos.

  2. Ninguém disse que militar não deve devotamento e as bla bla bla que vc está falando.
    O que está falando é que o direito político é um direito constitucional inviolável e é para todos inclusive para os militares (ponto). E se alguém discordar disso então não é uma questão de conversa e sim de cadeia, pois quem diz que militar não deve ter direitos políticos está cometendo crime.
    Se existe incompatibilidade entre os dois, Devotamento vs direito político, o que deveria ser modificado é o Devotamento e não o direito político.
    Atualmente, o militar que se candidata é licenciado e somente caso seja eleito que ele vai para a reserva, caso não se eleja retorna para o serviço ativo e para o Devotamento e os demais blá blá blá. E desse forma se garante os direitos políticos e o Devotamento.
    O que eles querem fazer com essa pec é que o militar seja desligado no momento da candidatura, sem direito a voltar pro serviço ativo caso não seja eleito. E isso é retirar dos militares seus direitos políticos.

  3. Se um ladrão pode ser candidato e exercer a presidência do país porque não um militar não pode se candidatar e , caso derrotado, voltar às fileiras das forças armadas? Seria um indivíduo desqualificado?

    1. Esse é o presidente que muitos passam o pano aqui….
      E não veem dizer que a culpa é o BOSTOnaro!!

      Dessa ele tá fora!!!

      Está sendo o Lula o mentor deste absurdo que tem como alvo os Praças Das FFAA!!!

  4. Aumento que é bom a porcaria deste governo não corre atrás né!!!

    Amanhã TODOS na Paulista!!!

    Lula….Tua Hora está chegando!!!

    Vc está traindo os Praças Das FFAA!!!

      1. Você é louco ou mal intencionado!!

        Por acaso está escrito golpe?

        Sou a favor da democracia 1000% mas crítico desse Desgoverno que ilude os Praças!!!

        Vc está me acusando disso???

  5. Quer dizer que não poderei me candidatar (coisa que até ladrão pode) senão vou pra reserva não remunerada? E votar, eu sou obrigado…E tem imbecil aqui (provavelmente esquerdista maldito) compactuando com isso… Tsc, Tsc. Faz o L, jumentada!!!

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