Forças Armadas afirmam que as considerações operacionais em torno da ofensiva ainda não foram finalizadas, incluindo muitas avaliações que surgiram nas discussões com o establishment políticoO Globo
Tel Aviv – As Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês) afirmaram abertamente, neste sábado, que há a necessidade de uma “manobra terrestre” e que ela “exigirá a entrada no centro de Gaza” para que se alcance o objetivo de se chegar aos integrantes do Hamas. A declaração é a confirmação mais clara e pública sobre a esperada invasão por terra em Gaza, que vem sendo especulada desde o ataque terrorista do grupo palestino na semana passada.
“Os batalhões e soldados do Exército israelense estão destacados por todo o país e estão preparados para aumentar a prontidão para as próximas fases da guerra, com ênfase em uma operação terrestre significativa”, informou um comunicado divulgado pelas forças israelenses neste sábado. Ainda de acordo com os militares, detalhes operacionais em torno da ofensiva ainda não foram definidos, e algumas avaliações estão sendo feitas junto ao establishment político.
Embora os detalhes da ofensiva ainda estejam em aberto, o anúncio do Exército israelense aponta para uma ação extensiva. Os militares falam na “implementação de um plano de ofensiva em larga escala, que inclui, entre outras coisas, um ataque integrado por ar, mar e terra”.
O comunicado verbaliza o que analistas anteciparam após o ultimato israelense para que a população civil deixasse o norte de Gaza, na sexta-feira. O prazo inicial, que ia até a meia-noite de sábado (18h de sexta em Brasília), foi ampliado para às 16h (10h em Brasília). Apesar dos apelos internacionais de que o tempo não era suficiente para a retirada de cerca de 1,1 milhão de pessoas, não foi estabelecido um novo prazo.
A escalada da atividade militar — não apenas contra Gaza, mas também contra alvos do Hezbollah no sul do Líbano — acompanha a resposta irredutível no campo político. Mesmo diante dos apelos por moderação na resposta militar e de algum tipo de trégua aos civis do território palestino, o discurso das principais autoridades israelenses segue fechado ao direito de Israel em se defender e a necessidade de impor uma resposta dura à violência sem precedentes do Hamas.
Em uma visita aos militares deslocados para a linha-de-frente com Gaza, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu voltou a dar sinais de que os preparativos são para uma guerra prolongada. Um dia depois de afirmar que os dias de bombardeio incessante, que vitimaram mais de 2 mil pessoas no enclave palestino, era “apenas o começo”, Netanyahu disse aos seus soldados que o conflito “vai continuar”.
— Vocês estão prontos para o que está por vir? Isso vai continuar — disse o premier aos soldados. Em suas redes sociais, Bibi divulgou fotos vestidos com colete a prova de balas enquanto falava com os militares.
A tônica é a mesma no gabinete, que agora é composto por aliados e opositores do premier. O ministro de governo Gideon Sa’ar defendeu, em uma entrevista a TV israelense, que a Faixa de Gaza “precisa ficar menor ao fim da guerra” e que deve ser criada uma zona de segurança entre os dois territórios, no qual quem adentrar seja interceptado.
— Os acampamentos em Gaza não devem ser renovados… mas eles [palestinos] devem pagar o preço da derrota — disse o ministro. —Nós precisamos deixar o objetivo da nossa campanha claro para todos em volta. Quem quer que comece uma guerra contra Israel precisa perder território.
A dimensão do impacto de uma invasão de Gaza pelo Exército israelense é difícil de estimar — para um lado e para o outro. Na última grande incursão por terra, em 2014, Israel perdeu dezenas de soldados no enclave palestino. No conflito atual, desde o ataque do último sábado, 279 soldados foram mortos e 126 foram sequestrados, segundo dados oficiais das autoridades do país.
Para a população civil na região, tanto uma operação militar quanto a campanha de sufocamento a qual estão submetidos são um desafio. A ONU emitiu um alerta de que ao menos 2 milhões de pessoas estão sob risco de ficar sem água na região, que já sofre com escassez de combustível, essencial para o abastecimento elétrico. De acordo com a Agência das Nações Unidas para Refugiados Palestinos (UNRWA, na sigla em inglês), as pessoas estão tendo de recorrer a água suja de poços, aumentando o risco de doenças.
“Tornou-se uma questão de vida e morte. Combustíveis precisam ser entregues para deixar água disponível para 2 milhões de pessoas”, disse em um comunicado Philippe Lazzarini, comissário-geral da UNRWA, apontando que as três usinas de dessalinização de Gaza, que produziam 21 milhões de litros de água potável por dia, paralisaram as operações após ficar sem energia.
Quase 1 milhão de pessoas — ou cerca de metade dos 2,2 milhões de moradores locais — foram desalojadas desde que o conflito começou, há oito dias. Neste sábado, o chefe do maior hospital de Gaza alertou que 35 mil pessoas estão abrigadas na infraestrutura, diante da expectativa da invasão terrestre.
Em meio a condenações internacionais ao modus operandi da resposta israelense, o Hamas aproveitou o cenário para denunciar crimes de guerra que estariam sendo praticados pelo Estado Judeu. Um dos líderes do braço político do Hamas, Ismail Haniyeh, afirmou que Israel havia decidido cometer crimes de guerras contra civis por sua incapacidade de derrotar os combatentes do grupo terrorista.
— Estamos enfrentando as consequências da derrota estratégica de Israel em 7 de outubro. Israel não conseguiu submeter nossos guerreiros, então se voltaram a cometer crimes de guerra contra civis com o apoio do governo americano e de vários países europeus — afirmou, em comentários publicados pelo jornal israelense Haaretz. — Apoiamos a heroica resistência à ocupação, que deu o primeiro passo para a derrota da entidade sionista.