Conheça o E-99M, avião da FAB que enxerga o que os radares não podem ver

E-99M, “avião-radar” da FAB, pode rastrear dezenas de objetos simultaneamente a mais de 700 km de distância, cobrindo o ponto cego dos radares
Crédito: Divulgação

Aeronave de alerta aéreo pode rastrear dezenas de objetos simultaneamente a mais de 700 km de distância, cobrindo o ponto cego dos radares

A antena do E-99M é um radar Erieye-ER de última geração, fabricado pela Saab Electronic Defence Systems, divisão do grupo sueco especializado em sistemas eletrônicos de defesa
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Thiago Vinholes – colaboração para o CNN Brasil Business
Uma estação de radar consegue detectar aviões a centenas de quilômetros de distância. No entanto, o equipamento tem um ponto fraco. Objetos no nível do mar ou voando em baixas altitudes só podem ser captados se estiverem no horizonte dos radares. Isso acontece porque a Terra é redonda.
Aproveitando essa brecha na curvatura do planeta, aviões militares podem executar ataques surpresa. Mesmo que a antena de um radar possa localizar objetos a centenas ou milhares de quilômetros de distância, um objeto voando a 200 metros acima do nível do mar só aparece nas telas dos operadores quando está a cerca de 50 km da antena. Pode ser um caça supersônico ou um míssil, que pode alcançar (e destruir) a estação em menos de dois minutos.
Quem também se aproveita dessa tática são os aviões usados no narcotráfico, que podem ultrapassar fronteiras despercebidos voando sem permissão além do horizonte dos radares.
Aqui no Brasil, a Força Aérea Brasileira (FAB) tem uma frota de aeronaves específicas para lidar com esse tipo de ameaça. É o jato E-99M, um “avião-radar”. No jargão militar, é o que chamam aeronave AEW&C, sigla em inglês para Plataforma Aérea de Controle Aéreo e Alerta Antecipado. De uma forma simples, é uma estação de radar voadora.
O E-99M consegue detectar objetos voando além do alcance de cobertura horizontal das estações terrestres. Ele faz a varredura no sentido de cima para baixo e não contrário como nas antenas em solo, aumentando o alcance de visão panorâmica sobre o nível do mar.

Netra, versão do ERJ-145 AEW&C da força aerea da Índia Crédito: IAF / Divulgação

Olhos no céu
O avião-radar da FAB com sua grande antena na parte superior da fuselagem é uma das peças mais exóticas e avançadas no inventário da Aeronáutica.
O E-99 é baseado no jato regional ERJ-145 da Embraer e está em serviço no Brasil há quase 20 anos. Em 2021, a Força Aérea recebeu os primeiros E-99M, versão modernizada com equipamentos de busca de maior alcance e capacidade.
A aeronave AEW&C foi um pedido da Aeronáutica para a implementação do projeto SIVAM (Sistema de Vigilância da Amazônia), uma rede de radares e outros recursos de monitoramento da atividade aérea na Amazônia Legal. A ativação do sistema aconteceu em 2002, mesmo ano em que o E-99 foi declarado operacional na FAB.
O desenvolvimento do E-99 começou nos anos 1990. O projeto da Embraer em parceria com a FAB era baseado originalmente no turboélice comercial EMB-120 Brasília. Porém, com atrasos no programa e o fim da produção do Brasília em 2001, optou-se por transformar a plataforma do jato regional ERJ-145.
O primeiro modelo com modificações primárias voou em 22 de maio de 1999. Oito meses depois, a aeronave decolou com sua característica antena no alto da fuselagem.
A antena do E-99M é um radar Erieye-ER de última geração, fabricado pela Saab Electronic Defence Systems, divisão do grupo sueco especializado em sistemas eletrônicos de defesa.
O equipamento funciona com pulso Doppler de média e alta frequência (pulsos eletromagnéticos que refletem em objetos por sua área de varredura).
No interior da antena, em forma de tábua, há 192 módulos de transmissão e recepção bidirecionais. São como os olhos de um lagarto, cada um capaz de se movimentar de forma independente e fixar o olhar em diferentes ameaças.
Cada lado da antena do E-99M cobre um setor de 150°. Voando a 7.620 metros de altitude, o avião-radar consegue detectar uma aeronave em voo rasante a 450 km de distância. Objetos em altitudes mais elevadas podem ser detectados há mais de 700 km.
A primeira versão do E-99 detectava alvos aéreos e navais. Com a modernização, ele incorporou a capacidade de observar objetos em terra. O equipamento também ficou mais preciso e pode acompanhar veículos menores, como motos aquáticas, botes e helicópteros em voo pairado.
O E-99M voa com oito tripulantes, sendo dois pilotos e seis operadores dos sistemas de radar. A FAB possui cinco unidades da aeronave, que são operadas pela Esquadrão Guardião, baseado em Anápolis (GO). A jato tem alcance de 3.000 km ou seis horas de voo sobre uma área de monitoramento.
A versão militar do ERJ-145 também foi exportada para o México, Grécia e Índia

Ave rara
Poucas nações possuem aeronaves AEW&C em suas frotas e um grupo menor ainda de países detém o conhecimento e estruturas para projetar esse tipo de equipamento. São aeronaves caras que exigem profissionais com grande conhecimento técnico para operá-los.
Na América do Sul, somente as forças aéreas do Brasil e do Chile (um Boeing EB-707) operam vetores com essa capacidade. Os chilenos, inclusive, confirmam recentemente a aquisição de dois Boeing E-3D Sentry de segunda mão do Reino Unido.
O E-3 Sentry, baseado no antigo jato comercial quadrimotor Boeing 707, é o avião-radar mais conhecido no mundo militar, em operação desde 1977 e com uma extensa ficha de combate com a força aérea dos Estados Unidos e de países membros da OTAN.
Diferentemente do E-99 da Embraer, que usa uma antena fixa, o avião de alerta da Boeing tem uma antena giratória, como de uma estação terrestre.
Os dois sistemas cumprem a mesma função, mas com algumas diferenças: a antena rotativa tem maior alcance de busca e cobertura 350°, enquanto a peça fixa é mais precisa e tem maior velocidade de recepção, fora a praticidade de ser compatível com aeronaves menores (e com custos operacionais reduzidos).
Aeronaves AEW&C também foram desenvolvidas na Rússia e China, enquanto a Suécia é famosa no fornecimento dos sistemas embarcados. Uma versão da antena sueca usada no E-99M, por exemplo, é usada no Saab GlobalEye (baseado na plataforma do jato executivo Bombardier Global 6000), outro expoente nessa categoria.
A tecnologia, no entanto, nasceu no Reino Unido, país pioneiro no desenvolvimento de radares. Durante a Segunda Guerra Mundial, os britânicos testaram bombardeiro adaptados com antenas giratórias. Nos anos seguintes, o sistema foi aperfeiçoado até os formatos de hoje.

Currículo de guerra do E-99
Os E-99 da FAB já participaram de ações de interceptação de aeronaves do narcotráfico em algumas oportunidades, auxiliando aviões de ataque e caças nos procedimentos de contato com o elemento em voo irregular. Esses encontros no território brasileiro, porém, nunca resultaram em ações confirmadas de abate.
Nesse tipo de ocorrência os pilotos dos aviões ilegais são obrigados a aterrissar ou acabam destruindo as aeronaves em pousos forçados na tentativa de escapar das autoridades.
Os modelos da Embraer em serviço com a força aérea da Índia são os que chegaram mais próximos de um autêntico combate aéreo.
Em 27 de fevereiro de 2019, um avião de vigilância Netra (designação indiana para o Embraer EMB-145 AEW&C) atuou como posto de controle aéreo avançado e orientou caças indianos na interceptação de aviões de ataque do Paquistão na conflituosa região da Caxemira. O encontro resultou num feroz embate aéreo, resultando na queda de um F-16 paquistanês e um MiG-21 indiano.
Aviões equipamentos com os poderosos radares são uma peça essencial no arsenal de uma força aérea moderna. Para a defesa de um país, é um instrumento militar que evita surpresas e encontra os problemas a distância, permitindo um maior tempo de reação contra uma ameaça.
CNN Brasil/montedo.com

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