Covid, suicídio e pouca comida: brasileiro conta rotina em tropa na Ucrânia

O ex-militar brasileiro Fabio Júnior de Oliveira (ajoelhado sem gorro) com outros voluntários das tropas ucranianas Imagem: Arquivo pessoal
O ex-militar brasileiro Fabio Júnior de Oliveira participou de treinamento como voluntário na Ucrânia Imagem: Arquivo pessoal

Herculano Barreto Filho
Do UOL, em São Paulo

Na madrugada de 22 de abril, voluntários estrangeiros que atuam nas tropas ucranianas na guerra contra a Rússia despertaram em uma área de treinamento com o som de um único tiro. Horas depois, a tropa descobriu que um recruta polonês havia tirado a própria vida com um disparo contra a cabeça.
O corpo dele foi enterrado em uma vala no local do disparo, identificada por uma cruz de madeira com bandeira da Ucrânia e outra do seu país de origem.
Com desembarque no Brasil previsto para a tarde deste domingo (1º), o ex-militar Fabio Júnior de Oliveira, 42, detalhou ao UOL o caso de suicídio em uma rotina de escassez de equipamentos, banho, comida e até de um surto de covid na barraca onde estava.
Procurada pela reportagem, a Legião Internacional de Defesa Territorial da Ucrânia não respondeu aos questionamentos feitos por email pela reportagem.
Três dias depois do alistamento na fronteira da Ucrânia com a Polônia, feito no dia 16 de abril, o brasileiro diz ter sido levado de ônibus para um dos campos de treinamento com 60 voluntários divididos em dois pelotões. Fabio foi integrado à unidade que falava inglês —a outra era formada por voluntários que se comunicavam em espanhol.

Arquivo pessoal Local onde o Exército ucraniano enterrou voluntário polonês que cometeu suicídio

Segundo ele, o polonês cometeu o suicídio com munição desviada, destinada apenas aos treinamentos em estandes de tiro de treinamento. Ele ficou sabendo do caso horas depois da morte, quando foi advertido por um sargento da unidade ao sentar na cama que pertencia ao recruta morto. O exército queria preservar o local até a chegada da polícia.
“Alguém escutou o tiro. Mas ninguém deu muita atenção, porque aqui isso é muito comum. Quando a gente foi sair para instrução, acharam o corpo dele. Não era para ninguém estar com munição ainda. Eles [militares ucranianos] não estavam fazendo inspeção no armamento. Passaram a fazer isso depois do suicídio”, conta Fabio, que diz ter prestado depoimento sobre o caso para a polícia ucraniana.

 

Oficial queria dispensar brasileiros, diz ex-militar
Fábio disse ter ouvido de um oficial ucraniano que os brasileiros seriam mandados embora em decorrência dos posicionamentos adotados pelo presidente Jair Bolsonaro (PL).
O presidente brasileiro tem evitado criticar a Rússia. Antes da invasão, ele visitou o presidente russo Vladimir Putin e expressou solidariedade ao país, que já fazia ações militares na fronteira com a Ucrânia.
“Aí, eu pedi para falar com ele em particular, em nome dos brasileiros. Mostrei para ele a reportagem do UOL [sobre alegados brasileiros criticando a postura de Bolsonaro]. E disse inclusive que a gente aceitaria renunciar à cidadania brasileira. Lógico que isso não pode ocorrer. Mas naquele momento foi um impulso que eu tive e funcionou”, lembra Fábio.
Contudo, não foi possível evitar a dispensa daqueles voluntários que não falavam inglês, segundo Fábio. Entre eles, havia nove brasileiros.
No fim de março, um email obtido pelo UOL atribuído à Legião Internacional de Defesa Territorial da Ucrânia informou ao ex-militar o veto de recrutamento de voluntários de toda a América Latina, da África e de 21 países para se aliar às tropas ucranianas.


“Infelizmente, os voluntários do Brasil e de alguns outros países não podem mais se juntar à legião”, disse o representante da unidade, em conversa gravada pelo brasileiro. O ex-militar então questionou se a recusa estaria relacionada à posição de Bolsonaro. “Sim, é por isso”, respondeu.
Dias depois, a legião reconsiderou o posicionamento e flexibilizou os critérios, voltando a permitir o ingresso de brasileiros. Um levantamento feito pelo Ministério de Defesa da Rússia rastreou 635 combatentes estrangeiros aliados às tropas ucranianas —13 deles eram brasileiros.

Assinatura de contrato do ex-militar brasileiro como voluntário do exército da Ucrânia Imagem: Arquivo pessoal

Comida escassa e ataque à base
O ex-militar brasileiro detalha uma rotina de dificuldades em meio aos treinamentos, como escassez até de recursos básicos, como alimentação e higiene pessoal.
Mesmo dentro de um batalhão de treinamento, só tinha banho duas vezes por semana, quando chegava o caminhão com chuveiros. A comida era controlada e não supria as nossas necessidades. Eles [ucranianos] não têm nem paiol. A munição ficava guardada dentro de um buraco no chão coberto por galhos”Fabio Júnior de Oliveira, ex-militar brasileiro
“Sei que é uma situação de guerra, mas a estrutura é muito precária. Nem o colete à prova de balas era adequado”, complementa.
Apesar das dificuldades, Fábio disse que a preparação para o conflito era intensa, com tiros em veículo em movimento, disparos de fuzil, treinamentos para ataques aéreos e cursos de transposição de obstáculos. “Os treinamentos são puxados. Bem mais intenso do que qualquer atividade do Exército brasileiro”, compara.
O momento de maior tensão ocorreu em meio a uma madrugada, quando relatou que o grupo precisou sair às pressas do alojamento e se esconder em uma área de mata. “O alarme do quartel disparou porque teve um ataque, mas não atingiu a base”.

Dispensa em massa e surto de covid
Em um cenário de precariedade, 27 dos 30 voluntários da unidade onde estava o ex-militar brasileiro pediram dispensa. Com isso, os outros três foram desligados.
“Ninguém quer ir para o front de batalha com o colete desajustado no corpo. Porque, se tomar um tiro, você vai morrer. O colete é a nossa primeira proteção”, explica.
Com o fim do seu pelotão, dissolvido desde quarta-feira, Fabio tinha duas alternativas: poderia voltar à fronteira com a Polônia e aguardar a formação de uma nova companhia para passar novamente por um período de treinamento ou pedir dispensa.
Disse ter optado pela segunda opção devido às dificuldades financeiras e aos problemas de saúde intensificados na última semana devido a um surto de covid no alojamento onde estava instalado. “A Polônia não exigiu teste [de covid]. Todos os voluntários na barraca onde eu estava alojado estavam com sintomas do vírus”, conta.
O ex-militar disse que precisou conciliar o desgaste em meio aos treinamentos com os sintomas da doença. “Passei por todo o treinamento com covid. Meu corpo doía todo, mas não desisti. Tive febre e garganta infeccionada. Agora, está saindo sangue quando vem a tosse ou os espirros”.
Apesar das dificuldades, Fabio disse que gostaria de ter condições para permanecer junto às tropas ucranianas. “Queria ter ajudado mais. Infelizmente, não deu”.

Nota da edição
Caso você esteja pensando em cometer suicídio, procure ajuda especializada como o CVV (Centro de Valorização da Vida) e os CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) da sua cidade. O CVV funciona 24 horas por dia (inclusive aos feriados) pelo telefone 188, e também atende por e-mail, chat e pessoalmente. São mais de 120 postos de atendimento em todo o Brasil.

UOL/montedo.com

29 respostas

  1. Fábio Júnior, vc deveria ter ficado lá na Ucrânia e não voltar para o Brasil para comer nossa comida produzida com fertilizantes da Rússia, por enquanto.

  2. Artigo 1º _ Todo o brasileiro é obrigado a ter vergonha na cara.
    Parágrafo único: revogam-se as disposições em contrário.

  3. Esse cara foi cabo do eb
    Achou que era faxina, pintar meio fio e fazer formatura. Viu o que é ação real.
    Falta de equipamentos, suicidios e tiroteios, essa é a realidade da PM.
    Uniforme vincado, coturno brilhando, TFM, carona de brabo e formaturas belíssimas… vai achando que a vida de um exército em combate é assim.
    A ucrania não quer mais brasileiros. Eles são fracos e desistem, representando um custo logístico inaceitável.
    É cabo véio… A atividade fim que justifica um exército não é servir de vigilante patrimonial na guarda… é isso ai… E não adianta rezar a oração do guerreiro pantaneiro

  4. Putz, essa guerra não vai acabar nunca, os voluntários estão aumentando os dias de guerra e o número de mortos.

    Quantos desses voluntários são Russos infiltrados?

    A Ucrânia está recebendo muito armamento e munições, quantas já foram desviadas para o mercado negro?

    Daqui a pouco o crime organizado estará recebendo armamentos e munições americanas que foram desviadas da Ucrânia.

    Tem muita gente sofrendo direta e indiretamente por causa dessa guerra.

    A calamidade não se abateu sobre o território ucraniano, ele espalhou pelo mundo, a quantidade de refugiados é enorme, os países terão dificuldade em cuidar dessa população que aumentou rapidamente.

    Essa guerra tem que acabar urgentemente.

    1. Nas redes sociais e sites de relacionamentos está cheio destes Rambos made in Paraguai, se voluntariem nas diversas calamidades que assolam nosso país, é mais nobre !

    2. É pq eles são ex-militares e querem atividade militar.
      Se fossem voluntários para enchentes, iriam fazer concurso para a defesa civil. Capische?

    3. Tu tá biruta? O que mais se viu foram voluntários nas diversas enchentes. Com essa ideia não pode ser outra coisa.

        1. E precisa vir de cantos distantes? O companheirismo vem de seu vizinho e a realidade mostrou isso. E na Bahia, por exemplo, ia vir sim da Argentina, mas houve negativa do PR.

          1. Caraca, não vi nenhum brasileiro pagando do seu próprio bolso a passagem para ajudar nas enchentes. Eu fui flagelado em duas enchentes e um deslizamento. Por favor, não fale o que vc não sabe ou não viveu. Vejo que vc é um cara que recebe a noticia pronta e não olha o outro lado.

          2. Não compensava o Brasil ia pagar tudo e graças a Deus nós podemos se virar sem ajuda estrangeira

  5. Conclui-se que com o desempenho desses voluntários e com os recursos disponíveis, a Ucrânia não precisará de russos para perder a guerra. Sozinha, ou mal acompanhada, já cai sem lutar.

  6. Até nessa questão o Bozonaro atrapalha:
    …”brasileiros seriam mandados embora em decorrência dos posicionamentos adotados pelo presidente Bolsonaro.”.
    Eita governozinho desgraçado!
    Amanhã, dia 02 de maio, ficará faltando apenas ‘5’ meses. 🙏
    Praça só vota em Praça.

  7. A nata da hipocrisia vai prá guerra imaginando um SPA, um filme, videogame. Não tem comida, não tem banho, não dá um tiro, e volta para a Terra Prometida e abençoada por Deus reclamando do nosso presidente.

  8. Que orgulho!
    O STen Dep Fed Hélio Lopes está ao lado do meu presidente em Ato em Brasília.
    Meus generais Ramos, Heleno e Braga Netto também acompanham nosso presidente.
    País maravilhoso que possui no primeiro escalão do governo militares tão preparados e dedicados, que orgulho.
    Bolsonaro meu malvado favorito só até 2026!
    Para o alto e avante só até 2026.
    Bolsonaro reeleito no 1° turno.

  9. Na minha infância um mercado tinha mil itens. Hoje, um supermercado tem 20 mil itens ou mais. Essa geração imagina que terão água, alimento e abrigo eternamente em qualquer dia e qualquer lugar. Deixem de cuidar e zelar para ver o que vai acontecer!

  10. Pura vaidade…graças a pessoas como ele que o povo ucraniano está morrendo. As FA ucranianas, apesar de bem treinadas, são mal equipadas para um confronto contra o russos. Continuar essa guerra é sacrificar o povo.

  11. Ainda bem que o Brasil não tem guerra. Os militares das Forças Armadas Brasil só fazem: Pintar, capinar, ordem unida, serviço de guarda, auxiliar de cozinha, comer e dormir. E ainda querem reajuste do salário.

    1. O que está fazendo neste site de notícias militares, procurando fotos de homens fardados? Para mim tem quatro tipos de pessoas que não gostam das Forças Armadas:
      – Aqueles que queriam fazer parte delas, mas não tiveram capacidade;
      – Aqueles que perderam esposa ou namorada para um militar;
      – Aqueles que não tiveram seu amor correspondido por um militar;
      – A junção de dois ou mais fatores destes acima elencados.
      Ah, se eu só como e durmo é porque eu posso, já você tem que trabalhar de sol a sol para ter um salário de miséria e vai se aposentar com uns oitenta anos de idade. Seria cômico se não fosse trágico.

    2. Ao Toinho Malvadeza: Aposto que vc deve ser aquele militar que vive se esquivando de missões e escalas, se fingindo de doido ou coisas do tipo…..Deve entupir a caixa do sped cobrando direitos e reclamando de tudo e todos….

      Lideranca negativa entre os pares….

    3. “…da Argentina…” O individuo que faz uma afirmação dessas, não leu o que foi oferecido. Foi oferecido pelo Governo Argentino 4 (quatro) bombeiros foi essa a ajuda oferecida no caso das cheias na Bahia, sem contar que todas as despesas com transporte da Argentina para o Brasil na vinda e na volta e de alojamento e alimentação, correriam por contar do governo Brasileiro. A decisão do governo foi contar com bombeiros brasileiros.

  12. A cada 10 anos a industria bélica mundial encontra e cria narrativas para renovar, desovar seus estoques e amedrontar o mundo para testar novas tecnologias e vender mais armas para os despreparados. Não deixa de ser uma grande lição de apreciação das estratégias e erros que podem ser até mesmo propositais. No fundo, são apenas negócios e jogo de poder, fundos de investimentos e banqueiros que financiam a todos com a apreciação e narrativas de órgãos internacionais e acordos que afetam a todos.

  13. As mnarativas é que eu acho o máximo…parece história de recruta pra namorada.

    Ajudando a manter uma guerra que não pode ser ganha, com OTAN ou sem. Este palhaço Zelensky destruiu a Ucrânia, matou seu povo e causou enorme sofrimento. Adivinha a mando de quem???

    Voltando ao nosso herói, quero ver essa valentia toda quando for para defender os interesses do Brasil, cobiçados exatamente por aqueles que fomentaram a guerra. Será que vai ser tão profissional e dedicado assim como diz ser em uma guerra na qual ele não sabe nada, um inocente útil.

  14. Se falou em renunciar a cidadania brasileira deve manter sua palavra e ir para venezuela.
    Essa coisa não é digna de ser chamado brasileiro.

  15. Se é ex-militar jurou defender a Bandeira do Brasil. “E disse inclusive que a gente aceitaria renunciar à cidadania brasileira”. Bora cassar o Certificado Militar desse “NÃO” cidadão brasileiro, afinal manifestou interesse em renunciar.

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