Vacina e legalidade: as razões que levaram Santos Cruz à oposição a Bolsonaro

General Carlos Alberto Santos Cruz disse que Bolsonaro não tem o apoio institucional das Forças Armadas
Imagem: RENATO COSTA /FRAMEPHOTO/FRAMEPHOTO/ESTADÃO CONTEÚDO

Quando decidiu escrever um artigo para o Estadão, o general decidiu que era chegada a hora de parar de poupar o ex-chefe; falta de ação contra pandemia o fez aumentar as críticas

Marcelo Godoy
Caro leitor,
o general Santos Cruz estava cuidando da roça quando tocou o telefone em sua casa. Queriam avisá-lo do conteúdo do inquérito dos atos antidemocráticos da Polícia Federal divulgado pelo Estadão. Pouco depois, começaram as chamadas dos jornalistas. Para a Coluna do Estadão, o general disse que nada daquilo lhe causava surpresa: “É lastimável o fluxo de dinheiro para alguns apoiadores, As consequências tem de ser dentro da lei.” O general torce. Contar a razão disso ajuda a pôr luz em alguns dos principais eventos do governo de Jair Bolsonaro.
Os privilégios aos blogueiros inventados pelo bolsonarismo para fazer propaganda do governo e gerar lucro para os envolvidos nessa operação não surpreenderam o general porque Santos Cruz conheceu de perto a ascensão de pessoas como Alan dos Santos, um dos parvenus investigados pela PF. Afinal, quem bancava as viagens a Brasília, as instalações confortáveis e as estadias no exterior dessa turma? É o que a PF e o general gostariam de saber.
Uma coisa, no entanto, o general sabe: quem abriu a gabinete presidencial para essa tropa de ‘nouveau riche’? A resposta é simples: o próprio presidente, aquele que afirmou na reunião ministerial de 22 de abril que seus adversários queriam a “nossa hemorroida, a nossa liberdade”. Sem explicar até agora o que uma tinha a ver com a outra… Generais como Santos Cruz recebem seus salários de fonte conhecida e descontam os impostos na fonte. A PF indaga como essas coisas funcionam com os blogueiros bolsonaristas.
Santos Cruz fora Secretário Nacional da Segurança Pública no governo de Michel Temer e um dos oficiais que participaram da articulação que levou Jair Bolsonaro ao poder. É criticado, por isso, pela oposição, que não lhe perdoa a adesão ao bolsonarismo. Diz que, ao contrário da maioria dos eleitores que se decepcionou com o governo, ele conhecia Bolsonaro e sabia o que esperar do colega. E se pergunta quais as ligações de Santos Cruz com o chamado “partido militar”, o grupo que resolveu trocar a política do Exército pela opção de tentar fazer política no Exército.
Apesar das desconfianças de alguns, o ex-ministro-chefe da secretaria de Governo é cortejado por partidos políticos e chegou a ser convidado pelo governador João Doria para entrar no PSDB. O general se diz um homem de direita. E, ao lado de colegas, apresentava um argumento para justificar sua passagem pela política: o combate à corrupção. Mas pensava que um governo devia dialogar e ouvir a todos, independentemente de partidos.
Sabia da limitação dos militares para assumir funções civis para as quais não foram treinados. Aos amigos, dizia: “Cabos sabem fazer muito bem as coisas militares que se esperam dos cabos, assim como os sargentos, os tenentes e os generais. É uma ilusão pensar que podemos cuidar de tudo.” No governo, teve a Secretaria de Comunicação – e suas verbas publicitárias – subordinada à sua pasta. Estudou como a publicidade oficial funcionava, quais contratos mantinha e com quem. E logo barrou um de R$ 39 milhões para divulgar a viagem de Bolsonaro a Davos. Justificou-se com o fato de que a imprensa já ia cobrir a presença do presidente no evento.
Também não aceitou direcionar a verba de publicidade a aliados e amigos, defendendo critérios técnicos como audiência, tiragem, abrangência e público alvo. Não demorou a entrar na mira da turma de Carlos Bolsonaro, o filho do presidente que é citado 43 vezes no inquérito que apura a existência de uma organização criminosa por trás dos atos em Brasília que pediam o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal. Santos Cruz não entendia por que um contrato de R$ 40 milhões era assinado com uma agência se a execução dele não passava de R$ 12 milhões.
Também não entendia por que o governo pretendia gastar tanto em publicidade com a reforma da Previdência, se era um tema já explorado pelo governo de Michel Temer e se havia apoio à medida ainda maior na atual Legislatura. Dizia então que a sociedade toda já sabia do que se tratava. E, ainda que pensasse que, ser filho de presidente, não é uma função pública, nada pôde contra as intrigas dos parvenus em busca de uma janelinha no Planalto.
Lembrava que a promessa do governo Bolsonaro era “fazer diferente” de seus antecessores. E pensava na Revolução dos Bichos, de quando Bola de Neve escreveu os princípios do animalismo – os sete mandamentos – na parede da granja. Naquele dia, todos partiram para colher o feno e quando voltaram à noite perceberam que o leite das vacas havia sumido.
Acabou demitido antes de apresentar seu plano de comunicação governamental no qual pretendia defender que a “comunicação do governo não pode ser mercadológica, não pode ser ideológica e deve transmitir informações, em vez de mera propaganda de governo ou de pessoas”. Por fim, o general pensava que a política do Planalto não podia concorrer com outros veículos de comunicação.
Após deixar o governo, Santos Cruz permaneceu quase um ano comedido ao falar do governo e poupava o presidente. Foi assim mesmo depois da demissão de Sérgio Moro e das afirmações do ministro da Justiça de que Bolsonaro queria usar a PF para favorecer o filho denunciado por desviar dinheiro público. O que o fez mudar de postura e passar a criticar abertamente o presidente foi a decisão de Bolsonaro comparecer a uma manifestação em frente ao QG do Exército, que pedia o fechamento do Congresso e do STF.
Decidiu falar no momento em que viu colegas da reserva próximos de Bolsonaro defenderem uma extravagância: o papel de Poder Moderador das Forças Armadas diante de conflitos institucionais. Era a tese do golpe de Estado que pretendia fingir legalidade onde só havia a intenção de se praticar um crime contra a Constituição. Ela levou o general a escrever um artigo publicado no Estadão. Seu primeiro passo na mudança de tom em relação ao governo.
Santos Cruz pressentiu a tentativa de se envolver o Exército em uma aventura, assim como o bridaieor Sérgio Xavier Ferolla, ex-presidente do Superior Tribunal Militar. Sabia que a grande maioria dos colegas não se envolveria na discussão, mas acreditava ser necessário enfrentar os extremistas que dominavam a cena. E se justificou para os amigos: “Há três pragas hoje no Brasil: a corrupção, o coronavírus e o fanatismo”. No dia 12 de novembro, foi mais longe ao escrever no Twitter: “Cansado do Show. O Brasil não é um País de maricas. É tolerante demais com a desigualdade social, corrupção, privilégios. Votou contra extremismos e corrupção. Votou por equilíbrio e união. Precisa de seriedade e não de show, espetáculo, embuste, fanfarronice e desrespeito.”


Um dia antes, havia desabafado contra Bolsonaro, que comemorara a morte de um brasileiro no que pensava ser o fracasso da coronavac, a vacina desenvolvida no Instituto Butantã em parceria com a Sinovac chinesa. “Ganhou de quem? Vacina, qualquer que seja, é saúde pública. É para a população. Não é assunto particular. O trato tem ser técnico e dentro da lei. Fora disso é irresponsabilidade, falta de noção mínima das obrigações, desrespeito pela saúde dos cidadãos. Vergonha! Sem classificação!”
Recentemente, para um político que o procurou pedindo que assinasse uma ficha de filiação partidária, o general explicou a recusa, afirmando que, assim, acredita que sua voz será ouvida por mais gente e não só pelos filiados daquele partido. Embora comemore a presença de militares na política como mais uma opção para o eleitor, Santos Cruz acredita que a uma ilusão de achar que eles são a solução para a gestão pública é muita vezes propagada pela imprensa. Militares são competentes para as coisas militares; as demais dependeriam da capacidade de cada um. Esse seria o caso do general Pazuello.
Não é de um intendente, como Pazuello, que o País precisaria à frente do Ministério da Saúde, mas de alguém que entenda de políticas públicas. O intendente especialista em logística não consegue comprar seringas e agulhas para vacinar a população. E se submete a um chefe que não o deixa comprar vacinas. Ou como afirmou Gonzalo Vecina, fundador ex-presidente da Anvisa: “Propor vacinação só em março e alcançar no máximo um terço da população em 2021 é um crime”. Militar da ativa, Pazuello ajudaria a vincular o Exército ao governo que comete esse crime. Mas antes de responsabilizar o general, Santos Cruz sabe que é preciso olhar para o Planalto. É lá que está o presidente da República, que devia sentar na cabeceira da mesa de reuniões e definir o que se deve fazer na maior crise sanitária do século, em vez de se omitir, brigar por causa de vacina e chamar o povo de maricas.
ESTADÃO/montedo.com

23 respostas

      1. É evidente que o passado nos condena ou nos liberta. Como não encontraram corrupção em Bolsonaro, encontraram outros adjetivos para desqualificá-lo. E continuam tentando, há 3 anos sem parar. É notável a preferencia de muitos pela bandidagem.

  1. Esse texto, mais uma narrativa, é o famoso “acuse os outros do que vc é” de Lênin. Estão loucos para construir alguém para 2022. Atiram para todos os lados. Até parece que não vemos as arbitrariedades do STF e do Congresso Nacional atrasando as reformas para o Brasil.

    Quando o youtuber do Estadão ganha R$ 2 milhões de monetização não tem PF. Quando o defensor de Boslonaro ganha R$ 100 mil, aí tem PF.

    Qualquer técnico laboratorista (imaginem os epidemiologistas) sabe que as vacinas seguras demoram muitos anos para serem desenvolvidas. Se já existe vacina pronta é sinal de que esse projeto do Covid 19 já estava em gestação há muitos anos.

    Todos os médicos sérios detectaram nas pessoas acometidas por esse vírus a ausência de Vitamina D. Logo, o melhor remédio para todos é tomar banhos de sol, 15 minutos por dia, aconselham os melhores médicos. Eis a razão do “fique em casa” dos oportunistas e ditadores de plantão: manter as pessoas doentes e ou adoecê-las.

  2. Esse Blog aqui é recalque puro , nunca vi o Capitão Montedo publicar nada favorável ao presidente , se publicou eu não vi e pedirei desculpas , o nobre Of. QAO postou algo quando a BR 163 foi asfaltada ? Já publicou a água chegando no sertão ? Já publicou que são 02 anos sem roubalheira federal ? tipo a dos Correios e a da Petrobrás na era PT, Já mostrou a multidão que recebe Bolsonaro em viagens ao interiorzão do Brasil?
    Gostaria de saber o candidato ideal para o Capitão Montedo , Ciro? Marina? Haddad? Lula ? Serra? Aécio? Boulos? Cabo Daciolo? E o melhor , o quê estariam fazendo se algum desses tivesse sido eleito …

    1. O único problema é que o Montedo só Republica o que a mídia publicou anteriormente. É como grande parte da mídia é contra o governo, você já viu…

      Onde que interessa mostrar as boas ações realizadas pelo governo?

    2. Tá ansioso para ver a divulgação das obras que foram inauguradas pelo Mito, cria um site de apoio a ele, subão. Mesmo que a maioria das obras já estavam em finalização, iniciadas em outros governos. Agora chegamos ao ponto de digerir criticas às publicações do capitão Montedo, que é mais antigo que você, é dono do site e é livre para publicar o que lhe aprouver, inclusive comentários esdrúxulos como o seu. Me poupe.

  3. “…o general Santos Cruz estava cuidando da roça.” Esse foi o trecho mais emblemático da retórica sofista jornalistica. Queria saber onde estavam esses defensores da moralidade quando a Petrobras era saqueada, quando FHC entregou as riquezas do subsolo à VALE do Rio Doce, quando terroristas recebiam medalhas das FFAA e quando Lula fez a doação do nosso dinheiro para construir obras em “democracias” ditatoriais? Aonde?

  4. Quais e quantos generais se manifestaram contra o Lula ou contra a Dilma na imprensa e/ou redes sociais? Que eu saiba nenhum! Agora que Bolsonaro está no Poder (Capitão) surgem alguns com seus projetos de poder ou magoados porque perderam seus cargos porém NENHUM DESSES generais, etc tem projeto para o Brasil, assim como quando estavam na ativa querem continuar sendo bajulados e paparicados além de arrumarem empregos para os seus.

  5. Observe o que diz a Lei assinada por bolsonaro!!!

    LEI Nº 13.979, DE 6 DE FEVEREIRO DE 2020

    Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019.

    Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional de que trata esta Lei, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, as seguintes medidas: (Redação dada pela Lei nº 14.035, de 2020)

    III – determinação de realização compulsória de:

    d) vacinação e outras medidas profiláticas; ou

    VIII – autorização excepcional e temporária para a importação e distribuição de quaisquer materiais, medicamentos, equipamentos e insumos da área de saúde sujeitos à vigilância sanitária sem registro na Anvisa considerados essenciais para auxiliar no combate à pandemia do coronavírus, desde que: (Redação dada pela Lei nº 14.006, de 2020)

    a) registrados por pelo menos 1 (uma) das seguintes autoridades sanitárias estrangeiras e autorizados à distribuição comercial em seus respectivos países: (Redação dada pela Lei nº 14.006, de 2020)

    1. Food and Drug Administration (FDA); (Incluído pela Lei nº 14.006, de 2020)

    2. European Medicines Agency (EMA); (Incluído pela Lei nº 14.006, de 2020)

    3. Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA); (Incluído pela Lei nº 14.006, de 2020)

    4. National Medical Products Administration (NMPA); (Incluído pela Lei nº 14.006, de 2020)

    Art. 8º Esta Lei vigorará enquanto estiver vigente o Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, observado o disposto no art. 4º-H desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.035, de 2020)

    Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
    Brasília, 6 de fevereiro de 2020; 199º da Independência e 132º da República.
    JAIR MESSIAS BOLSONARO
    Sérgio Moro
    Luiz Henrique Mandetta

    1. A lei tem 3 assinaturas. Logo em seguida o STF decidiu que o governo federal não determinaria as medidas de combate ao coronavírus e sim os prefeitos e governadores. Logo, onde se lê “…as autoridades poderão adotar…” leia-se “as determinações do STF”.

  6. Inveja, recalque e despeito, geram geram esse estado depressivo: cuspir no prato que queria se banquetear e não conseguiu ohh!
    Cuidado, depressão pode matar, gerar ulcera estomacal etc…
    Separar joio do trigo.

  7. Está certo o Exmo Sr General Santos Cruz. Fanfarronice, embuste, despreparo e desrespeito é que vemos todos os dias. O povo brasileiro, pacífico e trabalhador, merece mais consideração, mais atitude, mais empenho e mais respeito. Tenho dito.

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