Bolsonaro coloca militares na Anvisa para controlar política de vacinas contra coronavírus

ANVISA

O presidente Jair Bolsonaro está agindo para garantir o controle da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em articulação que alguns especialistas em saúde temem que irá politizar o órgão regulador e dar ao presidente, um dos mais proeminentes céticos em relação ao coronavírus no mundo, as rédeas sobre aprovações de vacinas contra a covid-19.
Em 12 de novembro, Bolsonaro indicou o tenente-coronel reformado do Exército Jorge Luiz Kormann para assumir um dos cinco cargos de diretoria da Anvisa. Sem experiência em medicina ou desenvolvimento de vacinas, Kormann deve liderar a unidade encarregada em dar sinal verde aos imunizantes. Caso o nome seja confirmado pelo Senado, como se espera, aliados de Bolsonaro ocuparão três das cinco diretorias da Anvisa, o que lhes dará maioria em todas as decisões da agência.
“A Anvisa hoje esta sendo aparelhada por diretores aliados com a postura negacionista e irresponsável do ponto de vista sanitário do Bolsonaro”, disse o deputado Alexandre Padilha (PT-SP), ex-ministro da Saúde.
A Reuters entrevistou mais de uma dezena de autoridades antigas e atuais, governadores e parlamentares sobre os planos de Bolsonaro para a Anvisa, um órgão regulador responsável pela aprovação de medicamentos, dispositivos e tratamentos.
Muitos disseram ter preocupação de que a crescente influência do presidente na Anvisa esteja politizando a agência, que vai ter a função de aprovar diferentes vacinas em teste no Brasil. Embora não tenham citado evidências específicas, alguns têm receio de que Bolsonaro, de olho na reeleição em 2022, possa usar as aprovações da Anvisa para acelerar as vacinas a aliados e retardar a chegada aos rivais.
Outros temem que a resistência de Bolsonaro às vacinas contra o coronavírus se infiltrará na Anvisa, minando a credibilidade e alimentando o crescente fervor antivacinas no país.
A Anvisa disse que é prerrogativa de Bolsonaro indicar diretores, cabendo ao Senado confirmá-los. “A Anvisa não tem … participação nesse processo”, afirmou em nota, recusando-se a fornecer mais comentários.
O Palácio do Planalto não respondeu aos pedidos de comentários. O Ministério da Saúde, onde Kormann trabalha atualmente como secretário-executivo adjunto, também não quis comentar. Kormann não respondeu às solicitações enviadas ao seu email.
Bolsonaro tem repetidamente minimizado a gravidade da Covid-19 e elogiado o medicamento contra a malária hidroxicloroquina, que não tem comprovação científica contra a doença e que ele diz ter tomado quando contraiu o coronavírus em julho. Na semana passada, ele disse que não tomaria qualquer vacina contra o coronavírus que se tornasse disponível. Bolsonaro afirmou que a recusa é seu “direito” e que não espera que o Congresso determine a obrigatoriedade das imunizações.
O apoio público à vacinação contra covid-19 está caindo em todo o Brasil, de acordo com pesquisa Datafolha de novembro com moradores de quatro grandes cidades. Em São Paulo, por exemplo, 72% dos entrevistados disseram que tomariam a vacina, queda de 7 pontos em relação ao mês anterior, enquanto o apoio à imunização obrigatória caiu 14 pontos, para 58%.
Silvia Waiãpi, 2ª tenente do Exército e secretária especial de saúde indígena do Ministério da Saúde, disse esperar que a formação militar de Kormann fortaleça a Anvisa. “O presidente Bolsonaro está colocando o país em ordem. A Anvisa é um órgão importante no Brasil e observa-se o extremo zelo e cuidado pra gerir as coisas ali”, declarou Waiãpi à Reuters.
No entanto, a Univisa, associação dos trabalhadores da Anvisa, e o Sinagências, sindicato nacional dos servidores das agências de regulação, se opuseram publicamente à indicação de Kormann por falta de experiência relevante. Os presidentes brasileiros sempre nomearam diretores da Anvisa. Mas a agência tradicionalmente tem agido de forma independente, e seus diretores escolhidos pela experiência, segundo funcionários atuais e antigos entrevistados pela Reuters.

SOLDADO LEAL
Além da inexperiência de Kormann, as fontes entrevistadas pela Reuters disseram que também se preocupam com sua proximidade com Bolsonaro. A Reuters analisou conversas internas no WhatsApp do Ministério da Saúde em junho, quando a pasta esteve envolvida em um escândalo depois que parou abruptamente de publicar dados abrangentes de casos e mortes de covid-19 em seu site. Kormann desempenhou papel central no esforço do ministério para ocultar essas estatísticas, mostraram as conversas.
Quando a pandemia atingiu o país, Bolsonaro afastou autoridades especialistas do Ministério da Saúde que defendiam medidas rígidas para controlar o vírus. Ele as substituiu por militares sem experiência em saúde pública, desencadeando eventos que deixaram o Brasil com o segundo maior número de mortes por covid-19 no mundo: quase 177.000 mortes e mais de 6,6 milhões de infecções confirmadas.
Agora, conforme o foco muda para a aprovação da vacina, Bolsonaro parece estar seguindo a mesma cartilha na Anvisa, de acordo com várias fontes. A nomeação de Kormann pode permitir que Bolsonaro dite a política de vacinas.
Bolsonaro tem, por exemplo, criticado uma vacina chinesa, desenvolvida pela Sinovac Biotech Ltd., que atualmente está sendo testada em estágio avançado no Estado de São Paulo. Fã declarado do presidente dos EUA, Donald Trump, ele imitou seu homólogo norte-americano ao condenar a China como a fonte da pandemia.
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), é amplamente visto como um potencial rival eleitoral de Bolsonaro em 2022. Seu Estado comprou milhões de doses da vacina da Sinovac para inocular moradores de São Paulo. Mas a Anvisa precisa primeiro atestar a segurança da vacina antes que as imunizações possam começar.
Bolsonaro muitas vezes buscou minar a credibilidade da vacina da Sinovac. Em outubro, ele reverteu rapidamente um anúncio de seu ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, um general do Exército na ativa, que havia dito em uma reunião com governadores que o governo federal planejava comprar a vacina da Sinovac para incluir no Programa Nacional de Imunização.
Bolsonaro disse que Pazuello foi mal interpretado: “Tenha certeza, não compraremos vacina chinesa”, afirmou o presidente na mídia social em 21 de outubro, respondendo a um apoiador que havia feito um apelo para que ele não comprasse a vacina.
Na terça-feira, o Ministério da Saúde delineou seu plano nacional preliminar de imunização. A vacina da Sinovac não estava listada entre as potenciais vacinas para compra.
O governo Bolsonaro já tem um acordo com a AstraZeneca para garantir o fornecimento de sua vacina e está procurando outras empresas, incluindo a Pfizer Inc. e a Janssen, uma unidade da Johnson & Johnson.
A Sinovac não respondeu aos pedidos de comentários. Pazuello não respondeu a perguntas sobre se ele foi mal interpretado, nem por que a Sinovac foi deixada de fora da lista.
No mês passado, o presidente comemorou como uma vitória pessoal quando a Anvisa suspendeu temporariamente os testes com a vacina da Sinovac devido ao suicídio de um voluntário. Determinou-se que a morte não tinha relação com a vacina e o teste foi retomado rapidamente.
Doria não respondeu às solicitações de comentário. Ele disse recentemente ao site de notícias Metrópoles que Bolsonaro tem influência no órgão regulador de saúde.
“Hoje há uma suspeita de que a Anvisa pode sofrer ingerências políticas do Palácio do Planalto e não ser uma agência independente como deveria ser, como deve ser”, afirmou Doria em entrevista publicada no dia 26 de novembro.

DADOS RETIRADOS
Bolsonaro já tem prevalência na Anvisa, que é comandada por um de seus aliados, o contra-almirante da Marinha Antonio Barra Torres. Formado em medicina e cirurgião, Barra Torres foi confirmado no posto no dia 20 de outubro. Torres foi notícia em março quando apareceu ao lado de Bolsonaro em um ato político ao ar livre em Brasília. Nenhum dos dois usava máscara.
Seis fontes disseram à Reuters que houve muitas reclamações internas na Anvisa sobre uma falha identificada da agência reguladora, sob Barra Torres, em contestar com mais força a defesa do presidente da hidroxicloroquina como uma “cura” para a covid-19.
A Anvisa não respondeu a um pedido de comentário.
Outra aliada de Bolsonaro, Cristiane Jourdan, também foi confirmada como diretora em 20 de outubro. Médica e ex-diretora de hospital, ela apoiou o uso da hidroxicloroquina para tratar a covid-19, afirmaram duas fontes.
A Anvisa não disponibilizou Barra Torres ou Jourdan para entrevistas. Eles não responderam às solicitações de comentários enviadas para suas contas de email.
Em entrevista à Reuters no final de outubro, Barra Torres disse que a Anvisa será sempre guiada pela ciência.
“A blindagem da Anvisa é a alta capacitação dos seus servidores e a profunda dedicação desses mesmos servidores em encontrar as soluções adequadas para o problema. E é claro, nós, os seus cinco diretores, nós não nos envolvemos com nenhuma questão política”, garantiu.
Kormann chegou ao Ministério da Saúde em maio, integrante de uma leva de militares indicados pelo governo Bolsonaro. Ao assumir o cargo na pasta, ele rapidamente se envolveu em polêmica.
No início de junho, quando a taxa de casos de coronavírus no Brasil começou a disparar, o Ministério da Saúde inesperadamente tirou do seu site dados públicos detalhados sobre a covid-19 que documentavam a epidemia ao longo do tempo por Estados e municípios. O movimento gerou indignação pública. Em poucos dias, o Supremo Tribunal Federal ordenou ao ministério que restabelecesse esses dados por uma questão de segurança pública.
Até agora, pouco se sabia sobre o que levou à retirada dessas informações.
A Reuters viu conversas internas no WhatsApp do Ministério da Saúde entre Kormann e outras autoridades. As mensagens mostram que Kormann, agindo por ordem de um superior, os orientava a retirar os dados.
As conversas mostram que Kormann e seus chefes militares ficaram alarmados com o número cumulativo de casos e mortes que pintava um quadro cada vez mais sombrio de uma pandemia que Bolsonaro tinha classificado como uma “gripezinha”. Eles queriam que esses dados cumulativos fossem removidos e apenas as contagens diárias menores mostradas.
“Retirar do ar números CUMULATIVOS!!!!”, escreveu Kormann às 17h23 em 5 de junho, de acordo com uma imagem da conversa vista pela Reuters. Esse conteúdo não havia sido divulgado anteriormente. Kormann deixou claro nas conversas que estava agindo por ordem de Pazuello.
O Ministério da Saúde não respondeu aos pedidos de comentários nem disponibilizou Kormann ou Pazuello para declarações. Pazuello não respondeu ao pedido de comentário enviado ao seu email.
Poucas horas depois da diretriz de Kormann em 5 de junho, quase todas as estatísticas da covid-19 foram retiradas do site.
No dia seguinte, Bolsonaro defendeu a retirada dos dados, dizendo no Twitter que eles não refletiam o momento em que o país estava.
Em 8 de junho, apenas três dias depois de Kormann ter dado a ordem de remover os dados, ele foi promovido a secretário-executivo adjunto da pasta.
“É um militar que é muito próximo do Bolsonaro. A interferência militar tem uma coisa de hieraquia. Mesmo sendo a Anvisa autônoma, o Bolsonaro é o comandante em chefe”, disse um ex-chefe do órgão regulador, referindo-se à indicação de Kormann.
REUTERS/montedo.com

20 respostas

  1. Um resumo da Lei Nº 13.979, DE 6 DE FEVEREIRO DE 2020,

    Observem que bolsonaro fala uma coisa, MAS ESCREVE outra!!! Sempre jogando as palavras para a plateia…

    Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019.

    Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional de que trata esta Lei, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, as seguintes medidas: (Redação dada pela Lei nº 14.035, de 2020)

    III – determinação de realização compulsória de:

    d) vacinação e outras medidas profiláticas; ou…

    VIII – autorização excepcional e temporária para a importação e distribuição de quaisquer materiais, medicamentos, equipamentos e insumos da área de saúde sujeitos à vigilância sanitária sem registro na Anvisa considerados essenciais para auxiliar no combate à pandemia do coronavírus, desde que: (Redação dada pela Lei nº 14.006, de 2020)

    a) registrados por pelo menos 1 (uma) das seguintes autoridades sanitárias estrangeiras e autorizados à distribuição comercial em seus respectivos países: (Redação dada pela Lei nº 14.006, de 2020)

    1. Food and Drug Administration (FDA); (Incluído pela Lei nº 14.006, de 2020)

    2. European Medicines Agency (EMA); (Incluído pela Lei nº 14.006, de 2020)

    3. Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA); (Incluído pela Lei nº 14.006, de 2020)

    4. National Medical Products Administration (NMPA); (Incluído pela Lei nº 14.006, de 2020)
    Art. 8º Esta Lei vigorará enquanto estiver vigente o Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, observado o disposto no art. 4º-H desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.035, de 2020)

    Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
    Brasília, 6 de fevereiro de 2020; 199º da Independência e 132º da República.
    JAIR MESSIAS BOLSONARO
    Sérgio Moro
    Luiz Henrique Mandetta

  2. Bolsonaro é um guri mimado que não aceita ser contrariado. O dono da bola, que joga mal mas tem que jogar e escolher o time e ganhar o jogo e fazer gol, sob pena de não ter mais jogo. E sabe quem são os militares? São os amiguinhos trogloditas burros que batiam nos que desrespeitavam asregras

    1. Quais regras? Jogar bem é com o Dória? O Flávio Dino? Mandetta? Quem governa não manda? As agencias reguladoras por acaso são um Estado à parte?

    1. A imprensa não teria esta reação, mas que teu ídolo dá umas pisadas feias na bola ele dá. Tua estrela guia tem necessidade de falar demais e politizar tudo. Deveria saber a hora de ficar quieto e a hora de pensar no povo, não na reeleição. Deveria ainda pensar que a vacina iria inclusive ajudá-lo, pois iria permitir a reabertura total. Poderia usar a vacina a seu favor, mas não, para contrariar o governador de São Paulo e não contrariar o amiguinho Trump, preferiu jogar todas as fichas na hidroxicloroquina. Trinta anos de política, mas comporta-se como um amador, tal qual os três príncipes. Quer saber, pega eles pra você e aproveita para levar todos os outros politicos, verdes ou vermelhos, de brinde.

      1. Se a politica para vc não presta, fica na tua, pague teus impostos e fique calado. A não ser que tenha perdido uma boca bilionária como os mídias perderam, vai ter que trabalhar duro para não ficar dependendo de bolsas estatais.

  3. “Bolsonaro tem repetidamente minimizado a gravidade da Covid-19 e elogiado o medicamento contra a malária hidroxicloroquina, que não tem comprovação científica contra a doença…”

    Mas qual medicamento ou vacina hoje tem comprovação científica senão o reforço da imunidade com vitamina D3? E o zinco, a ivermectina que muitos estão usando como profiláticos e tem dado certo? Ninguém vai lhes dar “comprovação científica”?

  4. Sindicatos, sempre por trás do atraso brasileiro. Querem que Bolsonaro indique inimigos? É assim que abrem as portas de suas casas para dormir com o inimigo? E ainda com essa historinha de gripezinha?

    Os dados reais dessa pandemia estão no cartório de registro civil. Essa pandemia mágica reduziu drasticamente as mortes por pneumonia(-50 mil), septicemia(-15mil), SRAG(-14 mil) em relação a 2019.

  5. Bolsonaro vai queimar o filme das FA. Em breve a gente vai ter que esconder a farda quando sair na rua para não apanhar da população. Hoje na fila do pão, o pessoal estava metendo o cacete na atuação dos militares. Infelizmente eu não tive coragem de falar para eles que no exército tem praças ( que estão no mesmo barco da população) e tem os oficiais generais ( que não passam de puxa saco e incompetentes, mas é lógico que não são todos)..

  6. Se a menos de 1 ano conseguiram criar uma vacina é claro que essa pandemia já estava planejada há muito mais tempo pela ONU, China e pelos proprietários da patente do coronavírus.

    Gostaria também que o Editor nos informasse: quantas pessoas na China já foram imunizadas pela coronavac do João Dória?

    1. Camarada, a vacina é essencial para a economia global. Tem muitos grandes empresários perdendo dinheiro com essa pandemia. É claro que existem aqueles que ganham com ela (sempre existem os que vendem lenços em funeral). Esse teu conspiracionismo negacionista é típico dos dementes que apoiam incondicionalmente as trapalhadas do atual governo. Se você se informasse melhor saberia que a China vacinou primeiro seu exército, ela não é boba, e que na Rússia a própria filha do presidente tomou a vacina deles. Enquanto a tão esperada vacina de Oxford ainda não mostrou eficiência para adultos com mais de 55 anos. O maior grupo de risco. E por aqui estamos sem vacina, sem plano de vacinação, sem seringas e sem logística alguma.

  7. Não existe essa questão de burocracia da ANVISA. Não existe vacina produzida em 1 ano. A vacina que demorou menos tempo para ser produzida foi em 4 anos.

    Os que querem uma vacinação rápida com qualquer vacina, incluindo os fabricantes, têm que assumir as responsabilidade civis e criminais pelas consequências que essas vacinas, sem total comprovação cientifica, podem provocar.

    1. Pelo jeito você deve ser expert em tecnologia imunológica. Deixa de ser burro. Essa pandemia está afetando seriamente a economia global. Desenvolver uma vacina em tempo recorde tem objetivos econômicos.

  8. O Pazuelo não conseguiu distribuir sete milhões de testes e com isto muitas vidas foram perdidas para o covid 19.Será que ele conseguirá montar um programa pára distribuir duzentos milhões de vacinas? Com um general deste nível o adversário sempre ganha.

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