Teto salarial de militares opõe Defesa a Economia

(Brasília - DF, 19/08/2020) Solenidade de Sanção de Medidas Provisórias de Facilitação de acesso ao Crédito.
Foto: Alan Santos/PR

Integrantes das Forças Armadas com cargo no governo obtêm aval da AGU para acumular remunerações acima do limite de R$ 39,3 mil; desde 2018, regra poupou R$ 518 milhões

Felipe Frazão, O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA – Uma nova benesse para militares da reserva tem colocado em lados opostos o Ministério da Defesa e o da Economia. A pasta comandada pelo general Fernando Azevedo conseguiu aval para que integrantes das Forças Armadas com cargo no governo acumulem remunerações acima do teto do funcionalismo – R$ 39,3 mil –, mas a equipe de Paulo Guedes tenta barrar. Em documento obtido pelo Estadão, a área econômica alerta para o possível impacto nas contas que a mudança na regra pode causar e aponta que, desde 2018, o desconto feito no salário de servidores poupou R$ 518 milhões aos cofres públicos.
Previsto na Constituição, o chamado “abate-teto” é um mecanismo que inibe o recebimento de “supersalários” na administração pública. Na prática, ele funciona como uma linha de corte que reduz a remuneração de servidores para limitá-la ao valor máximo permitido, que equivale aos vencimentos de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Só algumas verbas escapam, os chamados penduricalhos, como os jetons por participação em conselhos de estatais, auxílio-moradia, entre outros.
Com o argumento de que corrigiria distorções de militares da reserva que exercem cargos no governo sem receber o salário ou em troca de apenas uma parte, o Ministério da Defesa fez uma consulta à Advocacia-Geral da União (AGU) se poderia aplicar um entendimento diferente para a regra. A pasta argumenta, com apoio dos comandos de Aeronáutica, Exército e Marinha, que o abate-teto deveria limitar cada salário isoladamente. Assim, caso nenhuma das remunerações atinja o teto, o militar poderia recebê-las integralmente.
O ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações, Marcos Pontes, por exemplo, vem tendo o salário bruto do cargo, de R$ 30,9 mil, cortado mensalmente em R$ 14,7 mil por causa do abate-teto. Isso porque ele já recebe como tenente-coronel da reserva da Força Aérea Brasileira cerca de R$ 21 mil. Se o novo entendimento estivesse em vigor, Pontes poderia acumular as duas remunerações integralmente e, ao fim do mês, passaria a receber cerca de R$ 52 mil.
E ele nem é o que mais ganha. Bento Albuquerque, ministro de Minas e Energia, poderá acumular quase R$ 65 mil brutos apenas com as remunerações básicas. O militar ainda faz parte dos conselhos de administração da Itaipu Binacional e da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) – os jetons geram, respectivamente, mais R$ 14,9 mil e R$ 3,2 mil mensais.

Aval
Oficiais das Forças Armadas comandam nove ministérios e são maioria no Palácio do Planalto, de onde atuam nos bastidores na articulação com o Legislativo e o Judiciário, além dos órgãos de controle.
A AGU concordou com os argumentos da Defesa em abril. Em parecer, o órgão jurídico do governo citou entendimentos do STF e do Tribunal de Contas da União sobre o abate-teto. O caso base foi o de dois servidores do Mato Grosso que acumulavam cargos e tiveram aval da Justiça para que o redutor fosse aplicado separadamente e não nos vencimentos acumulados.
Porém, a pasta da Economia diz que essas decisões não são aplicadas automaticamente a todo o funcionalismo federal. E também não serviria de base, pois os ministros julgaram casos específicos.
Por causa dos gastos com a pandemia da covid-19, que levou o presidente Jair Bolsonaro a decretar estado de calamidade pública, o aval da AGU dado em abril deste ano pelo então ministro André Mendonça, atual titular da Justiça e Segurança Pública, foi suspenso em maio pelo seu sucessor, o atual advogado-geral da União, José Levi. Mas, na prática, outros ministérios, como o da Cidadania, já formularam consultas ao órgão sobre como proceder os pagamentos. Isso porque o parecer da AGU beneficia não só os militares, mas todos os servidores do governo que recebem salários de duas fontes diferentes.
Agora, técnicos da Economia pressionam Levi para que reveja a autorização dada por Mendonça. Eles argumentam que “não se pode flexibilizar o ‘teto’ para atender uma pequena classe da sociedade brasileira”. E alertam: “O já combalido Orçamento Público Federal terá de arcar com o aumento ilegal do pagamento de remunerações provenientes de acumulação de cargos, até mesmo em casos não permitidos pela Constituição”.
Os técnicos ressaltam que não há dotação orçamentária específica bancar esse aumento na despesa Orçamento de 2020 e que ela tampouco foi prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2021, dois impeditivos legais. A Secretaria de Gestão e Desempenho de Pessoal pediu o “reexame” do parecer pela AGU. “O entendimento proposto pela Advocacia-Geral da União acarretará elevado impacto financeiro”, diz o órgão.
O governo tem até esta segunda-feira, 31, para enviar ao Congresso Nacional a proposta orçamentária do ano que vem. Como revelou o Estadão, a previsão é de o Ministério da Defesa ter mais recursos que o da Educação, o que não acontece desde 2010.
Por enquanto, o abate-teto continua a descontar o somatório das remunerações de servidores quando há acúmulo de cargos, empregos, pensões e funções.

Pastas não se pronunciam
O Estadão encaminhou perguntas por escrito aos órgãos envolvidos na discussão sobre as mudanças no abate-teto. O Ministério da Economia não respondeu aos questionamentos. Tampouco o Ministério da Defesa, que alegou ser competência da AGU se pronunciar.
A AGU, por sua vez, disse apenas que o parecer que permite a aplicação do abate-teto separadamente em cada vencimento “segue suspenso”.
Nenhum dos três órgãos deu esclarecimentos sobre impactos financeiros, quantidade de servidores civis ou militares beneficiados, nem justificativas para a mudança de entendimento da regra constitucional que evita o pagamento de “supersalários”, a suspensão do parecer e previsão de quanto será retomado ou reavaliado.

Para lembrar: ato reajustou bonificação
Esta não é a primeira vez que o governo do presidente Jair Bolsonaro beneficia os militares em questões salariais. Como revelou o Estadão em junho, integrantes das Forças Armadas tiveram um reajuste que poderá chegar a até 73% na bonificação concedida para quem faz cursos ao longo da carreira.
Chamado de “adicional de habilitação”, o valor a mais do “penduricalho” passou a valer a partir de julho e terá um custo de R$ 1,3 bilhão neste ano, em plena pandemia do novo coronavírus, de acordo com nota técnica do Ministério da Economia e dados do Ministério da Defesa.
Com isso, um general de quatro estrelas, topo hierárquico das três Forças, passou a somar R$ 5.600 por mês ao soldo de R$ 13.400. Até então, o adicional era de cerca de R$ 4.000 mensais. Eles ainda acumulam outros adicionais que elevam o salário para, pelo menos, R$ 29.700 – a remuneração pode subir, a depender da formação, permanência em serviço, atividades e local de trabalho.
ESTADÃO/montedo.com

15 respostas

  1. Praças, seus politicos militares, seus comandantes e chefes, quando na função ou na situação ‘privilegiada’, em que possa representar o interesse da Força, NÃO O FAZEM.
    A regra desses caras: FARINHA POUCA…………

    1. Isso é uma vergonha!
      Todo os três poderes deveriam receber no máximo 10 salários mínimos e quando se aposentarem ganhar o teto do INSS. Se quiserem uma remuneração maior façam uma previdência privada.

    1. Enquanto nos pracas reformados e pensionistas somos sacaneados pelo presidente e esses generais, melancias pela lei 13954, a mesma que tirou da mesa dos pracas e pensionistas para elevar os salarios dos generais, ainda como se nao bastasse, querem acomular altos ganhos. Enquanto isso o Dep.federal general peternelli tenta mexer nas leis que nos dar direito de nos pracas fazer bico para complementar o salario, para nos prejudicar, esse deputado e um merda.

  2. Enquanto nossos soldos foram corroídos em quase 40% …os nossos ilustríssimos chefes pensam só no próprio umbigo…aumento linear para toda tropa com recomposição salarial? Nem passa pelas cabeças de nossos chefes!

    1. Não acho errado, porque os que se aposentaram por outros planos de previdência já recebem, acumulam. No entanto, gostaria que esses generas me explicassem porque eu não posso acumular o Tp Sv e Adicional de Disponibilidade, que nada tem a ver entre si.

  3. É óbvio que a acumulação remunerada dos cofres públicos somente é permitida nós casos previstos na constituição federal conforme preceitua o § 10 e inciso V e XVI art. 37 da CF/1988, nos outros casos devem fazer a opção da remuneração.

    Da mesma forma que a acumulação da remuneração dos cofres públicos não poderia ser superior a remuneração dos ministros STF, isso visa a proteção da União, valendo para todos os brasileiros e estrangeiros que recebem pelos cofres públicos brasileiros.

    O retorno ao serviço público somente é possível mediante aprovação em concurso, desde que haja possibilidade de cumulação dos proventos de aposentadoria com os vencimentos do novo cargo. Vedada a acumulação, não é possível o retorno do servidor ao trabalho no ente público”

    https://tj-sc.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/527295060/apelacao-civel-ac-16984720078240068-seara-0001698-4720078240068?ref=serp

    A Constituição Federal veda a percepção simultânea de proventos de aposentadoria com remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvadas as hipóteses de cargos acumuláveis na forma da Constituição, cargos eletivos e cargos em comissão (art. 37, § 10, da CF/1988, na redação dada pela EC nº 20/1998).

    http://www.famurs.com.br/noticias/artigo-stf-julga-desligar-servidor-aposentado-pelo-inss/

    Da Constituição Federal

    Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

    V – as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento;

    XVI – é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

    a) a de dois cargos de professor; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

    b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

    c) a de dois cargos privativos de médico; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

    c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas;

    § 10. É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.

  4. Como assim? Onde está a fé na missão? Enquanto isso, os estamentos inferiores se digladiando por migalhas… Nao se dizia que ambição por dinheiro é coisa de paisano, que nós somos movidos pela fé na missão?

  5. Nada mudou, continua o mesmo bacanal com dinheiro público. Outra: Paulo Guedes está correndo desse bacanal, ou ele entra na dança ou vai tomar um pé na bunda.

  6. Enquanto uns brigam por uma justa correção das gratificações outros brigam para cada vez mais encherem os bolsos de dinheiro ,parece que nada mudou ,a ganância fala mais alto .

  7. Caráter ,cada um mostra o seu ,e parece que estamos conhecendo um pouco do que fazem com a maioria ,vergonhoso ,ficando difícil de provar o contrário ,não podendo generalizar de forma alguma , onde esta o patriotismo ,coleguismo ,espirito de corpo etc .

  8. A maioria esta na reserva. Voltaram a trabalhar por que quiseram. Poe o pijama e vai para casa. É a mesma coisa de PTTC reclamar do salário.

  9. Ja estão aposentados na reserva ganhando muito bem ,chegou a hora do patriotismo falar mais alto e doarem seus salários de cargos para ajudar os brasileiros sem emprego ,é o melhor caminho para dar o exemplo ,caso contrário ficará muito feio para todos militares

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