Tribunal reverte condenação do Estado por morte de cadete em treinamento na Aman

Cadete Márcio Lapoente da Silveira, morto durante treinamento na AMAN – Arquivo O Globo

Após nova decisão, União não pagará indenização à família da vítima

JULIANA DAL PIVA
RIO DE JANEIRO
— A 3ª Seção Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região reverteu, em decisão nesta quinta-feira, as condenações por dano moral e as indenizações que a União e o capitão Antônio Carlos de Pessôa tinham sofrido devido à morte do cadete Márcio Lapoente da Silveira durante um treinamento da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), em Resende, no interior do Rio, em 1990.

O processo cível foi vencido pela família do militar em 2011, mas foi revisto agora. Pela nova decisão, foi afastada a responsabilidade do capitão. O tribunal entendeu que ele não foi condenado criminalmente pela morte e, por isso, não poderia ser responsabilizado. A União também foi absolvida da responsabilidade.

— Ele morreu duas vezes. Em 1990 e em 21 de junho de 2018. Isso é um absurdo! — diz Carmem Lapoente, mãe do cadete.

Com a nova decisão, a União também não precisará pagar mais a pensão e só foi condenada aos custos do funeral.

— O acórdão anterior em nenhum momento fala que ele foi condenado pela morte, mas sim porque se entendeu que as agressões e a omissão de socorro concorreram para o resultado: a morte — argumenta o advogado da família, Ricardo Dezzani.

O cadete morreu aos 18 anos após ser espancado e submetido a exercícios até a exaustão. Segundo relatos de colegas, Lapoente foi espancado pelo capitão Antônio Carlos de Pessôa porque pediu para ser liberado do exercício, após se sentir mal durante uma caminhada de cinco quilômetros. Ele teve que continuar com o exercício e desmaiou. Pessôa, então, chutou a cabeça do cadete e outras partes do corpo dele, que teve quatro dedos esmagados por uma coronha de fuzil.

Lapoente ficou exposto ao sol, inconsciente, por três horas, até ser socorrido por uma ambulância. Quando chegou ao Hospital Central do Exército, o cadete já estava morto.

Em 1992, a Justiça Militar julgou o capitão Antônio Carlos de Pessôa pela morte do cadete e o condenou por maus tratos a três meses de detenção, mas a execução foi suspensa por dois anos e o caso acabou arquivado.

Segundo o advogado da família de Lapoente, mesmo com o trânsito em julgado do processo cível, até hoje a indenização – num total de R$ 1 milhão a ser corrigida pelos juros do período – não tinha siso paga. Depois de esgotados os recursos, os advogados do capitão Pessôa entraram com um pedido de ação rescisória alegando que ocorreu uma “violação de disposição literal de lei”. A Advocacia Geral da União também pediu a suspensão do pagamento de uma pensão que foi direcionada para a mãe e para o irmão do cadete, que sofre de uma doença mental, no processo.
No âmbito cível, após o processo tramitar nas três instâncias, a Justiça condenou a União e o capitão Antônio Carlos de Pessôa ao pagamento de pensão e danos morais aos pais e ao irmão do cadete. O caso foi denunciado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA). Em 2012, a Secretaria de Direitos Humanos do governo federal resolveu firmar um acordo na CIDH e com os familiares do cadete.

— A União assume a responsabilidade para o processo não seguir na corte interamericana e 28 anos depois considera-se que não foi responsável? — questiona a defesa, que vai recorrer ao STJ.

A portaria publicada em 22 de outubro de 2012 reconhecia a responsabilidade do Estado pela morte e determinava a inauguração de uma placa na Aman em homenagem ao jovem — o que foi cumprido. Além disso, foi incluído um pedido de aplicação de medidas preventivas para evitar novos casos. Entre elas, a realização de estudos e gestões com vistas ao aprimoramento da legislação e da atuação das Justiças Comum e Militar e da ampliação do ensino de direitos humanos no currículo de formação militar.

Naquela época, a família e o governo decidiram não tratar de indenizações financeiras, o que seria resolvido pela Justiça comum brasileira.

A defesa do capitão Pessôa representada pelo advogado Raphael Dodd Milito informa que “foi finalmente feita justiça a uma pessoa que teve a sua vida arruinada pela criação de um fato e exploração de um fato lamentável que foi o falecimento do cadete Lapoente”. De acordo com Milito, a morte do cadete ocorreu por erro de diagnóstico dos médicos que o atenderam inicialmente na Aman e ontem o TRF-2 reconheceu por unanimidade o erro de fato da sentença anterior.

– O Brasil reconheceu numa decisão única e exclusivamente política na época a ministra dos Direitos Humanos era a deputada Maria do Rosário. Essa decisão não teve nenhuma compatibilidade com a verdade dos fatos apurados pelo Exército – disse o advogado Raphael Dodd Milito.

O Globo/montedo.com

7 respostas

  1. Mais uma oportunidade para tentar elamear a Instituição com mais credibilidade do país. E a jornalista autora do texto tem o perfil para tal missão. Ou os senhores acham que se tudo o que foi narrado no texto tivesse sido comprovado pela perícia o militar teria sido absolvido?

    1. Este posicionamento e de quem não conhece a escola de formação ou, compactua com tais procedimentos condenados pela própria Instituição.Que pena!

      Obs: A postagem com nome elogiando a Instituição e defendendo o indefensável, não conta para promoção a QAO nem para General.

    2. Só quem não é da caserna não sabe a mentira que o EB é. a Hipocrisia e a corrupção. Afinal é o exército do Brasil……pais sujo, o EB não seria diferente.

  2. Lamentável tudo isso, e mais estranho e que o militar, só por ter conhecimento de fato que infrinja o regulamento, já e considerado responsável, se mais antigo, não paira dúvidas. Então o jovem que adentra a instituição não está sob responsabilidade do Exército e da União? Como pode isso se até para estacionar em uma area de controle militar, nomeadamente em QG e OM, por estes controladas, já os torna responsáveis…O que dizer então do Capitão que não teve responsabilidade nenhuma e Além de não prestar socorro adequado, ainda espancou o jovem, um menino! não era curso de Comandos…Mas que tipo de gente pode pensar assim “não tenho nada com isso e a culpa de ter morrido e de quem morreu…” De lá para cá as coisas mudaram, fruto da consciência de militares responsáveis que tal fato excedia o máximo admitido e que a aludida gama de virtudes militares não pode ser só teoria mas, devem existir de fato e de direito.

  3. Não me admira essa decisão… E o capitão ???… Continuou sendo promovido até coronel ??? Mesmo estando Sub judice ??? É dessa forma que lidam com uma vida humana… Como se o culpado fosse o próprio cadete ??? Eu quero saber !!! O capitão, hoje, e coronel ???? Kkkkkkkk…. Claro que é ??? Nos tratam como otários….

  4. Pertencemos a uma Instituição onde ter conhecimento em direitos atinentes aos militares é tido como uma afronta aos superiores! E muitos questionam o por quê de muitos comentaristas comentarem como Anônimo. É simples: qualquer manifestação em direitos e que tenham alguma brecha de manifestação política é vista como transgressão. Mais uma situação de injustiça que ocorreu, promovida pelo corporativismo dos oficiais. Em um quartel no sul do País, um cap foi acusado de homicidio ao coagir um sgt recém egresso da escola a correr junto com ele, estando um calor de 42 graus e bandeira preta. Resultado? Nada ocorreu a ele, sendo até transferido.
    E ao primeiro comentarista, não se esqueça, amanhã poderá ser você ou seu filho que cairá nas mãos de um indivíduo desses! O EB está “Johnny Walker com Activia” pra você, que é só mais uma peça substituível do grande tabuleiro chamado EB!!!!!

  5. Art. 6º A Ficha de Inscrição, o Edital de abertura do CA e o Manual do Candidato, no qual consta a
    bibliografia para as provas do Exame Intelectual (EI), encontram-se disponíveis no endereço eletrônico da EsPCEx.
    § 1º Constarão da Ficha de Inscrição:
    III – a indicação de que, caso seja matriculado segundo as condições estabelecidas neste edital, aceita, de livre e espontânea vontade, submeter-se às normas do CA e às exigências da carreira militar;

    Aí, o candidato deve pensar: ” Que normas?, que exigências da Carreira Militar? “

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