Por que nossas Forças Armadas não são usadas na segurança pública mais vezes?

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forças armadas
Foto: Evaristo Sá
Vítor Hugo Almeida*
Vivemos um verdadeiro caos no que tange à segurança pública no País. Sete pessoas são mortas violentamente no Brasil a cada hora, o que equivale a uma bomba atômica semelhante à de Nagazaki sendo explodida por ano na terra brasilis, como nos informa o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
As polícias estaduais e federais, de um lado, não conseguem conter a onda crescente de criminalidade. Várias greves são deflagradas Brasil a fora em suas fileiras, evidenciando reivindicações majoritariamente justas no conteúdo, mas que acabam por expor a população ao recrudescimento abrupto da violência em suas cidades e em seus Estados.
As Forças Armadas brasileiras, de outro, dispõem de aproximadamente 350 mil militares, armamentos, munições, treinamento, recursos, doutrina, capacidade de coordenação, capilaridade, estrutura de comando, meios… tudo isso sendo preservado para uma – remota – guerra.
O cenário retratado, então, nos indica que seria o caso empregarmos as Forças Armadas recorrentemente no combate à criminalidade? Na minha opinião, a resposta seria negativa. Devemos ter tais instituições como último recurso no que tange à segurança pública. Explico.
Qual a missão precípua da Marinha, do Exército e da Aeronáutica? Defender a Pátria. Ponto. Atuam, em verdade, na defesa contra inimigos externos. Daí, os investimentos no desenvolvimento de um submarino com propulsão nuclear ou de um novo caça para defesa de nosso espaço aéreo. A principal postura estratégica é, por óbvio, a dissuasória.
O fato é que herdamos um País com imensas riquezas e que desperta interesses estrangeiros dos mais indeclaráveis. Assim, não podemos abrir mão da construção constante e alinhada de poder de combate suficiente para desestimular outras potências regionais ou até mesmo mundiais de ameaçar nossos interesses vitais.
Entender a relevância e a especificidade da missão das Forças armadas é, assim, algo importante. Eu tive a chance de, quando na ativa, servir na Costa do Marfim em duas oportunidades. Na primeira, numa missão de pronta-resposta (acionado no sábado, parti para África no dia seguinte) junto às Forças Especiais, permaneci sete meses em solo marfinense contribuindo para que nossa embaixada continuasse a funcionar e para que os brasileiros lá residentes tivessem maiores chances de escapar, caso a guerra fosse retomada do nada, em minutos ou horas, como costuma acontecer naquele continente; na segunda, um ano como observador militar das Nações Unidas, no interior do país, fiscalizando o cumprimento das resoluções do Conselho de Segurança pertinentes. Nas duas ocasiões, a despeito das cinco malárias que tentaram, sem sucesso, me repatriar, estive imerso num país destruído pela guerra. Percebi, ainda com maior clareza, a importância de se contar com Forças Armadas fortes, treinadas e identificadas com a Nação.
Um outro motivo a ser comentado tem cunho jurídico-constitucional. Trata-se do pétreo federalismo. Toda vez que empregamos as Forças Armadas em garantia da lei e da ordem, sem que haja a decretação de intervenção federal, estado de defesa ou de sítio, a meu ver, arranhamos em alguma medida o caráter federal do Estado Brasileiro. Isso, porque União, Estados e Municípios, numa perspectiva interna, são autônomos entre si, não havendo hipótese, fora das previstas na Constituição, para que a União intervenha nos Estados – ou nos Municípios de eventuais Territórios Federais – ou para que Estados intervenham nos Municípios localizados em seus limites. E o emprego de tropas federais em socorro aos Estados, ainda que solicitado por seus respectivos governadores, somente com base na Lei Complementar nº 97/1999, nesse compasso, guarda ares de inconstitucionalidade.
Temos que considerar, ainda, que as Forças Armadas são instituições de Estado e não do governo de plantão. Isso significa dizer que os limites à sua utilização no território nacional, de cunhos constitucional e legal, construídos historicamente, também têm a ver com a ideia de prevenção quanto ao uso político de seu emprego.
Crise nos presídios e governo federal capenga? Emprega-se o Exército nas prisões em busca de armas, celulares e drogas. É uma boa resposta, no campo político, porque as Forças Armadas são as instituições com maior aprovação e confiança da população, em contraste com o governo federal atual, um dos que ostentam maiores índices de reprovação de nossa História. Em termos concretos, entretanto, não se ataca o cerne do problema, adiando sua solução para a próxima gestão. Não se pode aceitar isso. Os militares, claro, têm de cumprir as ordens de seus chefes, mas a sociedade não precisa necessariamente tolerar isso calada.
Outro aspecto a ser considerado é a possibilidade de contaminação das tropas federais por criminosos. O contato constante de militares das Forças Armadas com a criminalidade, ainda mais por não ser o trabalho para o qual tais instituições foram estruturadas ao longo de séculos, aumenta o risco, já existente em qualquer cenário, de infiltração. Ocorre que a quantidade e a qualidade de armamentos e munições – e, também, as técnicas de combate com os quais tais infiltrados ou recrutados pelo crime travam contato – potencializam o perigo dessa contaminação para a sociedade como um todo. Esse, um dos motivos pelos quais os Operadores de Forças Especiais e os Combatentes Comandos se encontram em Goiânia hoje e não mais na cidade do Rio de Janeiro, para nossa alegria, claro.
Por fim, há que se considerar que o problema da segurança pública no Brasil exigirá soluções abrangentes, complexas, holísticas. Isso quer dizer que o emprego episódico e localizado das Forças Armadas pode até trazer algum alívio momentâneo para a sociedade ou comunidade local. Não será capaz, porém, de tocar em maior profundidade e perenidade as raízes dos problemas. Com a saída da tropa, tudo volta a ser como era antes. Cansado já de ver isso acontecer, repetidamente.
*Major das Forças Especiais do Exército Brasileiro (reserva não remunerada) e advogado.
HORA EXTRA/montedo.com

18 respostas

  1. Porque a constituição da República define as atribuições das FFAA. Como também da Polícia Federal e Rodoviária. Só que na nas polícias eles cumprem a lei. Nas FFAA existe a servidão e os Generais não dizem um não porque querem uma promoção ou um cargo na reserva. Tipo os camaradas do PT.

  2. As FFAA tinham que se recusar a fazer serviço dos incompetentes que falharam e que muitos dos seus integrantes deram guarida ao tráfico. Até porque nessas favelas as pessoas não gostam de polícias e passam a enfrentá-las em agrado aos bandidos. Conheço gente que não mora em favela mas vibra com morte de PMs; porém tem inteligência ZERO.

  3. Caçaram comunistas do mesmo jeito que se caça mosquito no país da dengue, chikungunya, zyka e febre amarela.

    Comando de Caça aos Comunistas – Desciclopédia

    As vezes, também é chamado de Aliança Anticomunista Brasileira, embora não saibamos se eram a mesma organização. O fato é que esses carinhas metiam mesmo era chumbo grosso em qualquer lazarento vestido de vermelho.

    http://desciclopedia.org/wiki/Comando_de_Ca%C3%A7a_aos_Comunistas

  4. O Exército é tão bom que nosso Oficial pediu para sair! Agora fica cheio de teoria querendo fazer política!
    E o salário???condicoes de moradia das Praças???
    Chega !!!!! Basta!!!

  5. O texto é interessante, mas, é mais do mesmo, aborda alguns pontos de vistas sempre do lado da instituição. É sabido que as FA não querem fazer o papel da polícia, mas a pior das desculpas é aquela que fala sobre o medo da contaminação, alias os militares brasileiros moram numa bolha? Aqui é igualzinho o Exercito Americano, onde todos os militares moram dentro dos Forts, onde funcionam verdadeiras mini-cidades, lógico que não, apenas alguns pequenos privelegiados tem a sorte de ocupar um PNR e ficar com a família protegida. Com a penúria salarial dos militares os mesmos estão morando cada vez mais perto de áreas de riscos e dominadas por gangues de traficantes e crime organizado, é só perguntar para qualquer militar de carreira que ele sabe onde é a boca de fumo no bairro dele, e não podemos deixar de esquecer de onde vem os nossos soldados, 99% vem da periferia, onde convivem anos após anos com o narcotráfico. O que leva o militar a desviar a sua conduta, não é o salario baixo, nem o local onde mora, é a sua formação e caráter, portanto esse discurso não se sustenta. Em relação ao federalismo brasileiro, é outro arremedo, o único estado brasileiro que quis fazer uso real do federalismo, foi o estado de SP, e aconteceu a revolução constitucionalista de 32. A federação dos estados brasileiros foi criada como cópia dos EUA, mas esqueceram de combinar com os estados e municípios, se tem alguma duvida é só verificar o repasse dos impostos, o cidadão mora, consume e gera imposto em seu município, e quem fica com a maior parte dos impostos é a união e os estados, o que mudou nos últimos nos é que o comando das PMs estaduais passaram dos oficiais do EB, para os Cel PM, desde então, os mesmos se comportam mais como líder de classe, de que como comandante, se tem alguma duvida, tem estado em que tem Cb da PM, deputado estadual, e ta lá o Cel PM, pedindo audiência e tomando chá de cadeira para falar com o subordinado e o chamando de excelência. O combate a criminalidade e ao crime organizado é um desafio muito grande hoje para qualquer PM de estado, tamanho a dimensão que o crime tomou, e se não houver uma colizão de todas as forças de segurança a situação só tende a piorar. Em relação ao EB, um efetivo de 250 mil homens para ficarem aquartelados, e apenas treinando para fazer uma hipotética guerra, contra quem? Lógico que a capacitação e treinamento é importante, e ninguém é contra. Mas vamos olhar o nosso vizinho, a Colômbia, talvez tenha hoje o exercito melhor aparelhado e o melhor treinado, pelos constantes combates com a guerrilha e narcotraficantes, e lá o Exercito controla e comanda todas as forças de segurança do país. Então a minha modesta opinião é que o EB deveria se preparar para fazer disso não de forma esporádica ou pontual, mas uma constante e capacitar os seus membros para essa nova função. E para finalizar, eu rolo de rir, quando vejo comentários aqui no blog de que o EB são os severinos da nação, o exercito em qualquer país do mundo, são instituições permanentes de estado, isso desde os primórdios, Alexandre, Gensis Khan, etc., pela organização, perenidade, cadeia de comando, pronta resposta, serão sempre utilizados pelo estado para fazer frente as grandes demandas da sociedade, gostem ou não, simples assim. Ah, já sei que vão reclamar do salário, está anotado.

  6. Sr. Montedo. Conheço muito bem essa turma de formação por ter vivência profissional com os mesmos. O Maj Vitor Hugo de Araújo Almeida é "01" da Turma de Infantaria, AMAN, 1998. Muitos primeiros colocados dessa turma foram embora. O "01" de Inf (Maj Vitor Hugo). O "01" de Art (Cap Vitor). O "01" de Eng (Cap Fernandes). O "01" de MB (Cap Calderaro). O "02" de Cav (Maj Pedro), dentre outros. Enfim, sobre a evasão de militares, com potencial de ascensão dentro do EB, os Srs. podem tirar a conclusão que desejarem. Gostaria, por intermédio do seu Blog, enviar uma sugestão ao Oficial da Reserva de primeira classe, possuidor do curso de Forças Especiais, Maj R1 Vitor Hugo: utilizar o(s) espaço(s) que conquistou, na função atual de assessor legislativo, em Brasília, para escrever sobre o tema mais latente que atinge a todos os Oficias e Praças, da ativa e da reserva: a importância de remunerar bem os seus quadros. Explico: remunerar bem pelo pela nossa disponibilidade, pela nossa capacidade de resolver situações-problema, agindo como integrante de grupo de"pronta-resposta", como aconteceu com muitos dos nossos, recentemente, no Estado do RN e pelas peculiaridades da vida na caserna. Escreva, também, o porquê de muitos de nossas Forças Especiais (e primeiros colocados), com vasto potencial e oportunidades da carreira terem saído do EB. è apenas uma sugestão… Sr. Montedo. Obrigado pela oportunidade se acontecer a publicação. Por oportuno, acho que devemos, em ano eleitoral, mais uma vez, utilizar as fontes abertas para tentar resgatar o debate sobre a questão financeira dos militares. Qualquer ganho nesse sentido (publicações em fontes abertas sobre remuneração) é mais do que estratégico e beneficia nossos filhos, além de nos trazer satisfação pessoal. "O trabalho (e o ganho pelo trabalho honesto) enaltece o homem". Att, TC Inf. contemporâneo da Turma de 98.

  7. Comentarista de 27 de janeiro de 2018 22:04.
    Quero complementar o seu post.
    Será que o EB conversa no seu Alto COmando sobre a saída desses primeiros colocados da turma da AMAN/98 da Instituição?
    Deduzo que não.
    Mas para quem estuda a metodologia científica e a análise qualitativa, essa turma serve como um bom ponto de partida para entender o que acontece na mente de parcela dos oficiais.
    Ajudaria, também, se tivessem o meso raciocínio com as Praças que se evadiram.
    Salário é, de fato, estratégico.
    Boa noite Srs. leitores do blog.

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