Lembranças…

Ruben Barcellos de Melo *

Lembra do que estava fazendo às 6 da manhã do dia 15 de janeiro de 1965?
Bom, muitos não lembram porque nem tinham nascido. Muitos outros não lembram porque nada de mais aconteceu nesse dia e nessa hora. Mas eu lembro.
Estava tomando banho, ansioso, pensando no café e na caminhada até o quartel do Mec. Era o dia da minha apresentação para o serviço militar.
Quando cheguei, a fila estava se formando, do lado de fora do portão. Muitos jovens de 18 anos, muitos rostos com espinhas, barbas ralas, tímidos bigodinhos e muitas calças de brim Coringa.
Logo chegou um graduado com uma prancheta e começou a chamar nome por nome. Meu nome estava lá, entre outros 200 nomes. Silvas, Rodrigues, Linhares, Dourados, Borbas, Veigas, Santos, Pereiras, Mouras e Barcellos.
Dali, em fila indiana, fomos separados em grupos de 50 mais ou menos, seguindo direções diversas no interior do quartel. Tudo era grande o bastante pra nos assustar pela quantidade. Enormes pavilhões com jeeps,caminhões, tanques de aço e lagarta. Alojamentos com beliches de madeira, azuis, e armários de alvenaria pequenos e escuros. As roupas das poucas camas arrumadas, com brancos lençóis e colchas igualmente brancas. Aos pés da cama, cuidadosamente dobrado, um cobertor de lã, verde, com listras marrons – letras pretas onde se lia 1o. Esqd Rec Mec.
Nos seguiam olhares curiosos pelo pátio, pelos alojamentos, pelos banheiros. Um saco de fardamento foi dado a cada um – exatamente igual em quantidade e espécie. O tempo é curto, a correria é muita. Alguém gritou: barbeiro! E fomos todos fazer fila pra cortar o cabelo – 4 zero, à maquina. O chão da barbearia escureceu. As cabeças branquearam. Os rostos mudaram e o chão tremeu quando começamos a marchar.
Muitos anos se passaram desde então. Pra ser mais exato – 50 anos!
Em 50 anos tanta coisa acontece: novas famílias se formam; perdas dolorosas acontecem; vidas novas surgem; amigos se forjam nas dificuldades do dia-a-dia; amigos se vão pra nunca mais; empregos vão e vem, como a saúde, a alegria e a tristeza, o tempo de plantar e de colher que nunca se altera.
Lembra do que estava fazendo de importante no dia 15 de janeiro de 2015?
Pode se fazer essa pergunta daqui a 50 anos.
Vai se lembrar?
* 2º Tenente QAO RRm

3 respostas

  1. Eu incorporei em outro ano, em outra unidade, mas o texto descreveu muito bem esse momento inesquecível para todos. Obrigado por me proporcionar uma viagem no tempo através desse pequeno fragmento, lembrando de um tempo em que envergar uma farda de nossas Forças Armadas era motivo de imenso orgulho.

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