Brasil na Segunda Guerra: onde estão nossos heróis?

Por que os combatentes brasileiros não são celebrados como os veteranos de outros países?
Veteranos da FEB Raul Kodana e José Antônio Marson, de Jacareí, SP (Imagem: Moraes Faria – Jacareí, Tempo & Memória)
Ricardo Bonalume Neto
Montanhas de livros e filmes foram e continuam sendo produzidos nos Estados Unidos e na Europa sobre seus principais heróis da Segunda Guerra Mundial. Pode ser o atirador de tocaia russo que consegue combater e sobreviver em Stalingrado; ou o piloto de bombardeiro britânico que participa de um ataque ousado contra represas alemãs; ou o submarinista americano que corre altos riscos para afundar um navio japonês. Ou mesmo um alemão que se arrisca para salvar judeus dos campos de extermínio nazistas.
Já no Brasil, o que existe basicamente é um grande silêncio sobre nossa participação nessa mesma guerra, cortado esporadicamente por um livro, um documentário, uma rara menção em filme ou série de televisão. Onde estão nossos heróis? Por que não são celebrados? Fiz essa pergunta para amigos historiadores que trabalham com temas militares. Um deles, Cesar Campiani Maximiano, é autor de um livro chamado exatamente Onde Estão Nossos Heróis – Uma Breve História dos Brasileiros na 2ª Guerra.
“A experiência de guerra não ecoou na sociedade brasileira, como ocorreu nos Estados Unidos ou na Europa. Os americanos mobilizaram 16 milhões de combatentes, a Europa foi diretamente afetada”, afirma Cesar. Ou seja, são sociedades fortemente afetadas pela guerra. Não havia família que não tivesse algum parente em uniforme ou ajudando no esforço de guerra. Continua Cesar: “No Brasil, a presença no além-mar foi de 26 mil homens apenas, e o impacto social do retorno desses veteranos não teve a mesma relevância do que nas outras sociedades. Assim, a lembrança da guerra em nosso país é quase que somente preservada pelos veteranos e suas famílias, por aficionados no assunto e pelas comemorações oficiais das Forças Armadas e prefeituras de pequenas cidades”.
O historiador Marcelo Augusto Moraes Gomes tem a mesma opinião. “São poucos os veteranos em nosso meio, considerando-se a população total do País. Então, diferentemente de outros países, onde você eventualmente tem um como vizinho, e não é difícil tê-lo sob o mesmo teto, aqui são poucos os que encontramos, e acredito que seja um fator a mais para a nossa falta de atenção sobre o assunto.”
Eu encontrei nossos veteranos ao fazer reportagens e depois até escrevi um livro sobre eles. Eram gente como Gerson Machado Pires, que comandou um pelotão de infantaria e viu amigos morrerem a seu lado. Ele foi voluntário para a guerra, mas confessava que tinha receio de como se comportaria em ação. Quando viu que conseguiria dar conta do recado, teve um grande alívio. Era de uma honestidade marcante.
Outro veterano impressionante era Alberto Martins Torres, que não só participou do afundamento de um submarino alemão, o U-199, ao largo do Rio de Janeiro, como foi para a Itália no 1º Grupo de Caça. Pilotou seu P-47 em 99 missões. Era um grande prazer ouvi-lo falar não apenas de suas façanhas – veteranos que são heróis de verdade não ficam se vangloriando de seus feitos –, mas das pequenas coisas da guerra.
Gerson Machado Pires e Alberto Martins Torres já morreram, assim como muitos outros. Restam cada vez menos veteranos da guerra que terminou já faz mais de 60 anos.
Mas não é só a quantidade pequena de ex-combatentes que afeta o modo como o País vê seus heróis de guerra. A questão envolve o relacionamento em geral entre civis e militares ao longo da história – especialmente aquela mais recente, durante e depois do regime militar.
Como diz o historiador Adler Homero Fonseca de Castro, “Há um problema de identificação entre o cidadão comum e o militar. Apesar de o número de recrutados ter sido mínimo durante toda a nossa história, era razoavelmente amplo até a década de 1940. Depois houve um certo distanciamento. É difícil o cidadão identificar-se com os valores específicos do Exército”.
Adler é pesquisador do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Ele está fazendo um estudo para tombar o Monumento Nacional aos Mortos da Segunda Guerra, no Rio de Janeiro, onde estão enterrados os mortos da Força Expedicionária Brasileira (FEB).
Houve também uma propaganda negativa de autores interessados em atacar o regime militar, mas que jogaram a FEB na mesma canoa. Foi o caso da dupla Waack/Back – o lamentável livro de 1985 do jornalista William José Waack, As Duas Faces da Glória – A FEB Vista pelos Seus Aliados e Inimigos, e o horripilante documentário Rádio Auriverde, do cineasta Sylvio Back. Felizmente, historiadores mais jovens estão corrigindo esses equívocos. E há também documentários melhores e honestos, como Senta a Pua!, de Erik de Castro.
Os veteranos podem morrer sossegados. Sua memória será preservada.
Ricardo Bonalume Neto, 45, é repórter da Folha de S. Paulo especializado em ciência e assuntos militares. Cobriu conflitos em vários continentes e é autor de A Nossa Segunda Guerra – Os Brasileiros em Combate, 1942-1945.
e-Guia do Estudante/monedo.com


15 respostas

  1. Uma sociedade é impulsionada por seus governantes, eles quem ditam os rumos e estabelecem regras a seguir, já dizia Confúcio há mts anos atrás. Vivemos um período, na América Latina de modo geral, de ojeriza a td q se refere aos militares. Buscam destituir de todas as formas sua importância, história e valor, isso dá audiência, vende jornais e, mais atual, dá mais "curtidas". Simples assim…
    Maj QCO Leonardo

  2. O bom exemplo deve partir de dentro de nossas casas, do seio das famílias. Que tipo de bom exemplo recebemos de dentro de nossa casa (as FA em geral)? Que dizer de nossa família então e dos mais velhos (os mais antigos, nossos comandantes), os que deveriam dar o exemplo!? NADA! Querem um bom exemplo? Vejam a foto da reportagem dos Boinas Verdes americanos… Todos com muitas medalhas, sinal de reconhecimento de seus superiores, do pessoal da casa mesmo! Aqui, medalhas só para os boludos, para os estrelados, aqueles que passam o dia na sugação do ar gelado do ar condicionado, que nem imaginam as dificuldades pelas quais passam os subordinados pelos quartéis da vida. Poderiam ter idéia caso os boludos da tropa tivessem a coragem de levar os problemas a até eles. Mas preferem esconder a sujeira, não dar trabalho, pois sabem que logo estarão lá também, mamando nas tetas gordas da mãe pátria, sustentados pelo suado dinheirinho do povo.

  3. Minha gente, nem mesmo os militares estão respeitando nossos herois! Eu estava em uma formatura dias atras e ví claramente um General censurar o Comandante de uma OM que por sua vez censurou o corneiteiro no meio do toque de presença de ex-combatente! Segundo o General tal toque só deve ser dado agora quando for formatura relativa à segunda Guerra! Um General enorme de Gordo que com certeza nunca saberá o que é enfrentar uma guerra! Se nós, militares, não nos damos valor, pois sabemos da história, como esperar reconhecimento de quem não sabe nem o que aconteceu? Lamentável!

  4. A desqualificação do livro de William Waack, "As Duas Faces da Glória" é injusta e míope. Nada do que ele escreveu já não tinha sido descrito, em detalhes mais pudicos pela época, no livro, "Depoimento dos Oficiais da Reserva sobre a FEB" de 1946. A novidade foi que Waack – um jornalista, não um historiador – fez o que nenhum pesquisador tinha feito antes: ele foi procurar o testemunho de primeira mão dos ex-combatentes alemães que enfrentaram a FEB. E essa comparação de perspectivas entre o que a história "chapa-branca" da FEB e os relatos do então inimigo, permitiu uma visão mais equilibrada do episódio. Waack deveria, isto sim, ser louvado como o primeiro autor que buscou colocar a campanha brasileira em um contexto mais realista. Ao contrário do que os militares faziam até então, em suas publicações oficiais vendendo a ilusão de que a FEB tinha sido uma "tropa de elite" que havia desempenhado um "papel fundamental" na vitória dos Aliados, na Campanha da Itália. O fato que devia servir de lição é que, um exército que passa décadas e décadas envolvido em lutas políticas, levantes internos, quando é chamado para a guerra de verdade, sofre muito, até conseguir aprender como se luta. Isso se tiver tempo e não for destruído primeiro. Uma lição que o EB deva levar em consideração hoje em dia. Depois de passar os últimos vinte anos em missões de paz em Angola, Timor Leste, Haiti, Favela do Alemão, Complexo da Maré, etc e tal, se tiver de participar de um combate de verdade, o EB vai sofrer e sofrer muito. Eu não sei se as lições do Haiti e do Complexo da Maré vão servir diante de um bom fogo de artilharia e de morteiro…

  5. Prezado Montedo,

    A ignorância e a falta de interesse da sociedade de maneira em geral pelos assuntos militares e de defesa, a meu ver se deve ao período de 1964 a 1985, tratado como Revolução por um lado e de Golpe por outro.
    Como está bem nítido atualmente, o lado que retrata esse período como um Golpe esta prevalecendo com larga vantagem sobre o que retrata essa parte da história como Revolução.
    A Revolução hoje é defendido principalmente pelos atores militares daquela época, que estão sendo levados a comissões e sem processados pelo Ministério Público, um grupo sem força política e sem respaldo, inclusive das próprias Forças Armadas.
    Por isso quem foi herói na 2ª Guerra, reconhecido por seus feitos até na Itália, vivem no anonimato nos dias de hoje, inclusive são renegados pelas próprias Forças Armadas.

    Quando será que superaremos esse episódio (1964-1985)?.

    1º Sgt Inf

  6. Onde estão nossos heróis? Presos na Papuda. Presidiários, ladrões corruptos, riem da nação enquanto nossos comandantes pregam medalhas em seus peitos. Agora que estão saindo todos de lá, provavelmente serão novamente reconhecidos, medalhados pelos estrelados, agraciados com diplomas de reconhecimento pelo heroísmo com que saquearam, assaltaram, sequestraram e assassinaram. Esse negócio de reconhecer quem trabalha é pura bobagem de americano. Ora, vê se pode! Dar medalha para praça. Chega a ser ridículo ver a foto daquelas praças americanas cheias de medalhas! Só falta quererem implantar essa besteira de meritocracia aqui no Brasil também. Demoramos tanto para aprimorar nosso sistema de premiação para puxa sacos, baba ovos e afins que seria decepcionante ver tudo isso ir por agua abaixo. Afinal, para que trabalhar se temos tudo o que precisamos bem ao nosso alcance, ao custo de uma mamada no ovo de nossos irmãos comunistas. Por isso é que tem tanto Subão que passa a vida toda trabalhando, se ralando e se esfalfando pra nada. Se tivesse passado a vida puxando o saco, sentado atrás de uma mesa e servindo capuccino pro chefe, hoje seria um medalhado oficial QAO, com passagem garantida para uma tetinha gostosa de PTTC. Trabalhar e se dedicar não dá mérito pra ninguém aqui no Brasil e não seria diferente no EB. Babe ovo e logo será reconhecido, mandado para o exterior fazer algum curso turístico e, na volta, ocupará uma vaga prêmio, no ar condicionado, ao lado do chefe e bem longe do material para o qual deveria ser designado para trabalhar após o curso. Provavelmente escalem algum "queimado" para fazer o seu serviço em seu lugar. Afinal, nosso sistema de premiação é bem mais meritocrático do que o deles. Quem paga por tudo isso? Ora, nós mesmos, omissos contribuintes…

  7. Nossos heróis estão no comando das forças armadas. Eu que ministrei ordem unida durante tantos anos, confesso que nunca vi uma imobilidade tão perfeita.

  8. kkkkkkkkkkkk. comentário das 18:27 PERFEITOOOOOOO ! ! !

    Se os próprios Militares não valorizam seus heróis da reserva como vão valorizar os da ATIVA, como vamos valorizar o nosso país ????
    E é pro isso que tá essa ZOOONAAAA !

  9. ONDE ESTÃO NOSSOS HERÓIS?SIMPLES:RETRATADOS NA MÚSICA BRASIL, DE CAZUZA,"NÃO ME CONVIDARAM PRA ESTA FESTA POBRE,QUE OS HOMENS ARMARAM,PRA ME CONVENCER,A PAGAR SEM VER,TODA ESSA DROGA, QUE JÁ VEM MALHADA ANTES DE EU NASCER.",E COM MAIS DEZESSEIS ANOS DO SISTEMA QUE AÍ ESTÁ,CAZUZA RETRATA BEM EM OUTRA MÚSICA SUA,O TEMPO NÃO PARA,"SUA PISCINA ESTÁ CHEIA DE RATOS,SUAS IDEIAS NÃO CORRESPONDEM AO FATOS.POBRE BRASIL.

  10. Anônimo das 13:39hs, não e uma crítica, porém antes de desqualificarmos o que não vivemos devemos pesquisar as fontes, vá na wikipédia e veja, fui lá, a própria biblioteca digital questiona as fontes desse tão renomado jornalista que também não viveu aquela época que aliás pelo passar do tempo, hoje existem poucas pessoas sóbrias em condições de relatar o que passaram, por favor não desmereça os nosso heróis que sairam daqui para lutar uma guerra que não era deles, boa noite.
    Rozario

  11. Não valorizamos nossos homens, valorizamos o material, o equipamento, não valorizamos a vida de quem foi para o front, de quem morreu lá e de quem por ventura irá…
    Isso é um erro não só do governo, mas nosso.
    PARABÉNS AOS EX-PRACINHAS

  12. Parabéns ex pracinhas. Passei trinta anos na farda e não vivenciei uma guerra. Caso eu tivesse participado com certeza que gostaria de ser homenageado pelos meus irmãos Brasileiros e amigos da farda e também teria orgulho de portar as condecorações a que tivesse direito, porém, ficaria muito envergonhado de compor o seleto grupo de agraciados com medalhas que hoje em dia é composto de heróis e pasmem condenados da justiça cumprindo pena. Isso é uma vergonha para nossos heróis e para nossos irmãos Brasileiros que tanto amam essa ainda pátria verde, amarelo, azul e branca.

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